O Secretário da Receita Federal do Brasil, o economista Marcos Cintra, está para apresentar a proposta que implanta o imposto único que tem como principal obstáculo a quebra da forma federativa do Estado protegida em nível de cláusula pétrea.
Todavia, a PEC nº 45/19 em tramitação acelerada na Câmara Federal igualmente afronta a forma federativa, à medida que retira dos Estados e dos Municípios os impostos de maior arrecadação, o ICMS e o ISS, respectivamente. E contém o agravante de instituir o IBS de difícil operacionalização, quer por representar um conceito em aberto, quer porque a sua regulamentação, fiscalização, arrecadação e representação extrajudicial e judicial ficará em mãos de um comitê gestor formado por representantes da União, dos 27 Estados e de mais de 5.500 Municípios.
Não é preciso um grande esforço mental para entender o grau de complicação, de atritos e dificuldades que surgirão na prática do dia a dia.
Assim, é preferível a adoção de um imposto único, mas de forma a preservar o princípio federativo, cometendo a cada ente político o seu imposto único.
À União caberia o imposto único incidindo sobre a transação financeira, nos moldes da antiga CPMF.
Aos Estados competiria instituir o imposto único fundado nas atividades comerciais, ou seja, sobre as operações relativas a circulação de mercadorias, sem envolver qualquer tipo de prestações de serviços.
Finalmente, aos Municípios caberia o imposto único incidente sobre os serviços definidos em lei complementar que incluiria, além dos serviços especificados na LC nº 116/2003, os serviços de transportes em geral e os de comunicação.
O volume da arrecadação para cada ente político seria ajustado pela simples calibragem das alíquotas que seriam fixadas inicialmente de forma a propiciar o mesmo volume de arrecadação proporcionado pelo sistema tributário em vigor.
A única objeção de relevo que se tem feito é a de que a transação financeira nem sempre expressa um signo presuntivo de riqueza.
De fato, existem movimentações financeiras que representam meras entradas e saídas de caixa, sem envolver qualquer conteúdo de natureza econômica.
Excepcionar essas movimentações de caixa seria comprometer a única virtude desse imposto único, fundado na arrecadação automática pela rede bancária, pois o sistema de informatização do banco não teria como identificar, dentre as movimentações financeiras, aquelas que não expressam signos presuntivos de riqueza.
Outro argumento contra o imposto sobre transação financeira que se tem apontado é o de que ele irá alimentar a prática do mocambo. Este é um argumento histórico que não mais encontra respaldo na realidade atual.Transportar dinheiro em mala é uma exceção praticada por agentes do crime.
O certo é que não existe imposto imune a críticas. O IOF, por exemplo, incide sobre o mútuo bancário, sem que se possa sustentar que alguém que está se socorrendo de um mútuo para satisfação de suas necessidades básicas está revelando sinais exteriores de riqueza.
Uma vez implantado o imposto sobre transação financeira na esfera da União a prática diária irá apontando os meios adequados para o contribuinte deixar de incidir na tributação sobre operações bancárias que não expressam circulação de riqueza. A experiência da antiga CPMF poderá ser aproveitada e aperfeiçoada. Lembro-me que naquela época eu evitava de fazer transferência de recursos financeiros de uma conta bancária para outra.
Poder-se-ia objetar, também, que o imposto incidente sobre a transação financeira nos moldes da antiga CPMF deixará de fora um contingente de contribuintes em potencial sem conta bancária, representado pela população mais humilde e carente.
De qualquer forma, a idéia de um imposto único federal é válida. Pode-se pensar em uma outra materialidade, elegendo uma base de incidência suficientemente ampla como, por exemplo, a renda ou até mesmo operações sobre bens em geral, excluídos os serviços. Não se deve ter em mente qualquer preocupação com a eventual bitributação econômica em face do preconizado imposto único nas esferas estadual (comércio) e municipal (serviços). Como todos o sabem, a bitributação econômica é inevitável em havendo mais de uma esfera impositiva.
Substituir os atuais seis impostos federais vigentes por um só, e eliminar os três impostos estaduais e municipais, substituindo-os por apenas um imposto para cada esfera impositiva, sem sombra de dúvida, representará uma tremenda simplificação do sistema tributário, propiciando uma enorme economia de tempo para os sujeitos ativos e passivos da obrigação tributária. Os contribuintes se veriam livres da terrível carga burocrática que desvia grande parte do seu tempo destinado ao desenvolvimento de suas atividades econômicas, encarecendo o custo das mercadorias e dos serviços.
Mas, essa proposta é para a hipótese de se decidir politicamente pela alteração radical do sistema tributário vigente, como as propostas que estão sendo discutidas no Congresso Nacional. O ideal seria uma reforma no plano infraconstitucional para unificar o PIS/COFINS, o IR/CSLL e implementar a compensação tributária e a transação tributária, além de coibir o poder normativo de órgãos administrativos e proibir a alteração da legislação tributária mais de uma vez por ano, fixar prazo razoável de duração do processo administrativo tributário e, finalmente eliminar gradualmente os incentivos fiscais. No nível constitucional seriam feitas apenas emendas pontuais para proibir o uso da medida provisória em matéria tributária para assegurar estabilidade às normas de natureza tributária, vedar a tributação por dentro para eliminar as contendas judiciais intermináveis, submeter a definição de fato gerador de contribuições sociais ao princípio da reserva de lei complementar, e proibir a modulação de efeitos em matéria tributária.
SP, 18-7-19.