Fonte: Semanário da Zona Norte - 8/7/2021jose r nalini a4277

Oitenta e nove anos se passaram, desde que São Paulo viveu a sua epopeia constitucionalista. A data mais significativa para a gente Bandeirante é a celebração dessa luta que se travou com irmãos, porque os paulistas exigiam uma Constituição e a redemocratização do Brasil.

É importante que as novas gerações compreendam o que se passou nesta unidade da federação a partir de 9/7/1932. É claro que o movimento começou muito antes. Para Aureliano Leite, “quem quiser estudar a Revolução Constitucionalista, só poderá fazê-lo com fidelidade começando no ano da graça de 1901, a partir de a Dissidência, chefiada pela veneranda figura do ex-Presidente da República, aquele que José do Patrocínio chamara ”Santo Varão da Democracia” - Prudente de Morais”.

Qual a relevância de se fazer infância e juventude se debruçarem sobre episódio que em 2022 completará 90 anos? Existem mais semelhanças do que se possa imaginar entre o que viviam os brasileiros em 1932 e o que vivem em 2021. Todos ainda somos brasileiros patriotas. Podemos dizer como Martins Fontes: “queremos a nossa grandeza, adoramos a nossa amplitude, nos orgulhamos por fazer parte integrante dessa extensão territorial privilegiada, única no planeta pela multiplicidade das suas maravilhas!”.

Todos nós brasileiros amamos a liberdade, nossa predestinação histórica. E com idêntica intensidade, odiamos a ditadura. Depois de ouvir cânticos entoados à liberdade, podemos ecoar, com Martins Fontes que “o termo ditadura afronta, avilta, injuria como um rebenque suspenso. Perante a consciência universal, na torrente libertadora dos nossos dias, quem, monstruosamente, horrendamente, procura perpetuar-se num cargo, contra a vontade dos seus concidadãos, só merece a repulsa dos criminosos”.

O poeta falava de Getúlio Vargas e vaticinava: “Entreguemos à justiça da história semelhante monstrengo, mas em primeiro lugar, expulsemo-lo da sua posição. A humanidade amaldiçoa todos os ditadores, todas as tiranias. Estas expressões indignas vão ser banidas de todos os vocabulários. Castiguemos a azorrague quem foi capaz de tentar vilipendiar o Brasil”.

Mas qual era a intenção de São Paulo em 32?

“Trabalhar! Eis o que São Paulo quer, sempre quis, sempre fez. Seus campos, suas fábricas, seus laboratórios, seus centros comerciais, suas universidades, suas escolas de toda a espécie, trabalham, trabalham, porque a melhor maneira de orar é laborar. E é o conjunto de todos esses trabalhos seculares que fizemos este estado milagroso e construímos a nossa oficina”. O que São Paulo continuava a querer? “Que queremos? Continuar a trabalhar. Mas, para isso, precisamos de paz, de serenidade, de organização”.

Ibrahim Nobre, o “tribuno de 32”, era o indutor de um ânimo entusiasmado de quem pretendia devolver o Brasil à segurança jurídica, base para o verdadeiro desenvolvimento, que é o progresso ético, mais do que ilusórios e passageiros êxitos econômicos. Sua oração candente conseguia inflamar os corações: “És Paulista? Ah! Então tu me compreendes! Trazes como eu o luto em tua alma e lágrimas de fel no coração. Ferve em teu peito a cólera sagrada, de quem recebe em face a bofetada, o insulto, a vilania, a humilhação”.

No ardor da refrega, já derramado em solo bandeirante o sangue paulista, Altino Arantes pronunciou, ao microfone da Rádio Educadora, um discurso em 22/7/1932: “No propósito inconfessável, na ânsia criminosa de perpetuar-se no poder – de que não tem sabido ou não tem querido usar em benefício da paz e da felicidade da Nação – a ditadura, obcecada pela cobiça de mando que a inspira e desvaira, persiste no seu plano de enganar o povo brasileiro sobre a realidade do movimento revolucionário de São Paulo e sobre os altos objetivos que ele colima e há de realizar, irresistivelmente…”

Lutar pelo Estado de Direito de índole democrática não podia constituir crime. Altino Arantes exclama, com seu fervor patriótico: “Não somos rebeldes, nem criminosos, só porque lutamos para restaurar a estrutura jurídica da Nação. Não somos rebeldes nem criminosos, só porque pelejamos por reintegrá-la no regime da ordem e da lei – único que permite a existência digna e o progresso seguro dos povos civilizados. Se, neste instante decisivo para o nosso futuro, a Nação brasileira se divide, lamentavelmente, em dois campos opostos, força é reconhecer que num deles fala a Justiça, e impera o Direito; no outro colhia a intriga; remancha a ambição; avilta e oprime a tirania..”. E concluía: “Entre esses dois campos, já não pode haver zona intermédia ou neutra!”.

O que foi 32? pergunta o saudoso e inolvidável príncipe dos poetas brasileiros, Paulo Bomfim. E responde em prosa poética: “Foi a soma dos sonhos e o sacrifício de um povo”. Onde estão em 2021 os sonhos paulistas? Haverá quem se disponha a se sacrificar por eles?

*Reitor da Uniregistral, docente da Pós-Graduação da Uninove e presidente da Academia Paulista de Letras – 2021-2022.