foto 6 fe2a3Duas questões pacificadas na jurisprudência voltaram a ser rediscutidas no STF sob o rito de repercussão geral. Refiro-me à definição da natureza jurídica do terço constitucional de férias, indenizadas ou gozadas (tema 985), e à questão da incidência ou não da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias (tema 163). Aliás, o segundo tema discutido é prejudicial em relação ao primeiro tema.

As matérias sub judice já estavam pacificadas no âmbito do STJ que decidiu sob o rito de recursos repetitivos firmando a tese da natureza indenizatória do terço constitucional de férias indenizadas e gozadas, conforme ementa abaixo:

 “PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA A CARGO DA EMPRESA. REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. DISCUSSÃO A RESPEITO DA INCIDÊNCIA OU NÃO SOBRE AS SEGUINTES VERBAS: TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS; SALÁRIO MATERNIDADE; SALÁRIO PATERNIDADE; AVISO PRÉVIO INDENIZADO; IMPORTÂNCIA PAGA NOS QUINZE DIAS QUE ANTECEDEM O AUXÍLIO-DOENÇA.

1. Recurso especial de HIDRO JET EQUIPAMENTOS HIDRÁULICOS LTDA.

1.1 Prescrição.

O Supremo Tribunal Federal ao apreciar o RE 566.621/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 11.10.2011, no regime dos arts. 543-A e 543-B do CPC (repercussão geral), pacificou entendimento no sentido de que, "reconhecida a inconstitucionalidade art. 4º, segunda parte, da LC 118/05, considerando-se válida a aplicação do novo prazo de 5 anos tão-somente às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005". No âmbito desta Corte, a questão em comento foi apreciada no REsp 1.269.570/MG (1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 4.6.2012), submetido ao regime do art. 543-C do CPC, ficando consignado que, "para as ações ajuizadas a partir de 9.6.2005, aplica-se o art. 3º, da Lei Complementar n. 118/2005, contando-se o prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação em cinco anos a partir do pagamento antecipado de que trata o art. 150, § 1º, do CTN".

1.2 Terço constitucional de férias.

No que se refere ao adicional de férias relativo às férias indenizadas, a não incidência de contribuição previdenciária decorre de expressa previsão legal (art. 28, § 9º, "d", da Lei 8.212/91 - redação dada pela Lei 9.528/97).

Em relação ao adicional de férias concernente às férias gozadas, tal importância possui natureza indenizatória/compensatória, e não constitui ganho habitual do empregado, razão pela qual sobre ela não é possível a incidência de contribuição previdenciária (a cargo da empresa). A Primeira Seção/STJ, no julgamento do AgRg nos EREsp 957.719/SC (Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe de 16.11.2010), ratificando entendimento das Turmas de Direito Público deste Tribunal, adotou a seguinte orientação: "Jurisprudência das Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte consolidada no sentido de afastar a contribuição previdenciária do terço de férias também de empregados celetistas contratados por empresas privadas".

1.3 Salário maternidade.

[...]

2.4 Terço constitucional de férias.

O tema foi exaustivamente enfrentado no recurso especial da empresa (contribuinte), levando em consideração os argumentos apresentados pela Fazenda Nacional em todas as suas manifestações. Por tal razão, no ponto, fica prejudicado o recurso especial da Fazenda Nacional.

3. Conclusão.

Recurso especial de HIDRO JET EQUIPAMENTOS HIDRÁULICOS LTDA parcialmente provido, apenas para afastar a incidência de contribuição previdenciária sobre o adicional de férias (terço constitucional) concernente às férias gozadas.

Recurso especial da Fazenda Nacional não provido.

Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 - Presidência/STJ” (REsp nº 1230957/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 26-02-2014, DJe 18-03-2014).

O STJ no uso de sua competência constitucional interpretou e aplicou corretamente o disposto na letra d, do § 9º, do art. 28 da Lei nº 8.212/91, que exclui da base de cálculo da contribuição previdenciária “as importâncias recebidas a título de férias indenizadas e respectivo adicional constitucional, inclusive o valor correspondente a dobra da remuneração de férias de que trata o art. 137 da Consolidação da Leis do Trabalho - CLT”.

A PGFN que havia baixado Resolução no sentido de não mais interpor recursos contra decisões desfavoráveis à União resolveu voltar atrás escudada no argumento de que o § 11 do art. 201 da CF assim prescreve:

“Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios nos casos e na forma da lei”.

A confusão é óbvia. Pergunta-se, o que “os ganhos habituais do empregado” referidos nesse § 11 tem a ver com a verba de natureza indenizatória? Habitual ou não, se a verba tem natureza indenizatória não estará logicamente compreendida na expressão “ganhos habituais do empregado”. “Verba indenizatória” e “ganhos habituais” são expressões antagônicas.

E mais, não cabe a Constituição definir a base de cálculo de tributos. Com relação a impostos a Constituição fixou a competência privativa da Lei Complementar de definir o fato gerador, a base de cálculo e os contribuintes (art. 146, III, a).

O texto constitucional é silente quanto à espécie contribuição social. É certo, porém, que o CTN colocou sob reserva de lei a fixação da alíquota do tributo e da sua base de cálculo (art. 97, IV).

O certo é que não cabe à Constituição entrar em detalhes descrevendo a base de cálculo de cada tributo, nem a sua alíquota, salvo se expressamente assim estiver prescrito por opção do legislador constituinte, o que não é o caso sob exame. Parece patente à luz da ordem jurídica global que a definição da base de cálculo, com a inclusão ou exclusão das verbas tributáveis ou não, é tarefa cabente ao legislador infraconstitucional sendo, portanto, constitucionais às hipóteses taxativas de exclusões previstas no § 9º, do art. 28 da Lei nº 8.212/91.

Colocada a questão sobre esse prisma a discussão sobre as duas questões acima mencionadas já estavam superiormente dirimidas de forma definitiva pelo STJ, órgão jurisdicional competente para zelar pela aplicação uniforme da legislação federal (art. 105, inciso III da CF).

Somente a irresistível vontade do fisco de litigar pode explicar a provocação desnecessária do STF que poderá, eventualmente, reverter aquela decisão escorreita do STJ, trazendo uma insegurança jurídica a exemplo do que aconteceu com a cobrança da COFINS dos profissionais liberais que deveria ter sido examinado tão somente à luz do § 2º, do art. 2º da LINDB.

 

SP, 23-11-18.

* Jurista e professor com 32 obras publicadas.