Fonte: Jornal SP Norte - 22/4/2025 - Dircêo Torrecillas Ramos
A Constituição da República do Brasil, de 5 de outubro de 1988, no Título II, Dos Direitos e garantias Fundamentais, Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, artigo 5º inciso IV, expressa – “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. No inciso V, diz – “é assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.
Até este momento verificamos a distinção entre pensamento e manifestação do pensamento. No primeiro caso não poderão responsabilizar porque impossível saber o que se pensa, como, quando e se vai aplicar. Apenas ao manifestar o pensamento poderemos avaliar os atos de quem os pratica. Veda-se o anonimato, facilitando a individualização, a autoria, a materialidade, se cometeu abusos, ou se agiu no exercício de sua liberdade constitucional. Ainda mais, o inciso V oferece o direito de defesa proporcional ao agravo, e a indenização, compensando o dano material, moral ou à imagem. Poderá ocorrer abusos, mas haverá a punição correspondente.
Os incisos VI e VII e VIII asseguram e garantem a liberdade religiosa, destacando este último, “ninguém será privado dos direito por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política. Estas últimas devem ser respeitadas, representam a diversidade democrática.
O inciso IX, manda – “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença”. Aqui, mais uma vez, o Congresso Constituinte, com poderes extraordinários, referiu-se à expressão e não ao pensamento. Impôs, taxativamente, a liberdade, vedando a censura ou autorização posterior, o que significa, “a fortiori”, por maior razão “a priori”.
O inciso X, determina que – “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material decorrente de sua violação. Vejamos que este dispositivo guarda relação como citado inciso V. Em uma interpretação sistemática, verificamos o direito de resposta, defesa, proporcionais, além da indenização pelo dano material ou moral decorrentes da violação. Acrescente-se que no inciso X, trata-se de crimes e são punidos, o que chama à atenção é a verificação da criminalidade: a classificação, os elementos do tipo, se foi concretizado, se é mentira, desinformação ou se refere a verdades, para condenar ou absolver.
Na ORDEM SOCIAL, Capítulo V, DA COMUNICAÇÃO SOCIAL, Artigo 220, diz a Constituição brasileira – “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. Mais uma vez encontramos a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma de processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição. É de se perguntar: a desmonetização das redes é uma restrição? O §1º, do artigo 220, determina – Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no artigo 5º, IV, V, X XIII e XIV. Não foi citado anteriormente, o inciso XIII, o qual compreende a liberdade de trabalho, oficio ou profissão de acordo com as qualificações que a lei estabelecer. Entretanto, o inciso XIV, reforça a comunicação social em um Estado Democrático de Direito ao expressar – “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. O povo tem o direito constitucional de informar e ser informado, o sigilo da fonte é uma garantia para o informante e para o profissional da comunicação.
Conclui-se que a Legislação existe, é clara, dá liberdade à manifestação, à expressão, como cláusulas pétreas do artigo 5º, protegidas pelo artigo 60, §4º, inciso IV e artigo 220, da comunicação social. Entretanto pune os excessos, as mentiras ou desinformação, quando existirem e assim consideradas pela opinião comum dos hermeneutas. Essas liberdades dizem respeito ao cidadão, ao povo em geral. Com relação às imunidades parlamentares, temos exceções.
Imunidades Parlamentares
Conforme Louis Favoreu1, “as imunidades têm por fim a proteção do mandato contra perseguições judiciárias abusivas, permitindo total liberdade de pensamento e de ação”.
Nas constituições brasileiras encontramos sua evolução e alcance, de acordo com a vontade do legislador Constituinte:
A Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824, seu artigo 26: “os membros de cada uma das Câmaras são invioláveis pelas opiniões que proferirem no exercício das suas funções”
“ActoAddicional” de 12 de Agosto de 1834, no seu artigo 21: “Os membros das Assembleias provinciais serão invioláveis pelas opiniões que emitirem no exercício de suas funções”
A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891, com as Emendas de 7 de setembro de 1926, em seu artigo 19, acrescenta “palavras e votos”, alcança o exercício do mandato, expressa: “Os deputados e senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato”.
O Texto Magno da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgado em 16 de julho de 1934, não é diferente ao manifestar em seu artigo 31: “Os Deputados são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício das funções do mandato” apenas deixa mais claro quanto às funções do mandato e não durante o exercício do mandato. Refere-se somente aos Deputados porque o artigo 22 determina que o “Poder Legislativo é exercido pela Câmara dos Deputados, com a colaboração do Senado Federal”.
A Constituição de 1937, em seu artigo 43, operou uma restrição quanto ao alcance e retirou “palavras”: “Só perante sua respectiva Câmara responderão os membros do Parlamento nacional pelas opiniões e votos que, emitirem no exercício de suas funções; não estarão, porém, isentos da responsabilidade civil e criminal por difamação, calúnia, injúria, ultraje à moral pública ou provocação pública ao crime”
A Lei Maior da República dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1946, com suas retificações de 15 de outubro de 1946, em seu artigo 44: “Os deputados e os senadores são invioláveis no exercício do mandato, por suas opiniões, palavras e votos”.
Volta, portanto, a incluir os senadores como em 1891 e enquadrar o exercício do mandato e não no exercício de funções do mandato. Excluiu as ressalvas.
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1967, com as Emendas 1 de 30 de outubro de 1969 e 22 de 29 de junho de 1982, no artigo 32, traz alterações: “Os deputados e senadores são invioláveis no exercício do mandato, por suas opiniões, palavras e votos, salvo no caso de crime, contra a honra”.
No texto original a ressalva era para injúria, difamação ou calúnia, ou nos casos previstos na Lei de Segurança Nacional. Restringiu a imunidade, responsabilidade (inviolabilidade) dos parlamentares, ressalvando os crimes contra a honra.
O Texto, original, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, em seu artigo 53, resumiu, simplificou e acabou gerando dúvidas e confusões: “Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos”.
Não faz referência ao exercício do mandato, no exercício das funções do mandato e nem fez ressalvas. A Emenda Constitucional nº 35, de 20 de dezembro de 2001, deu nova redação ao artigo 53: “Os Deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
Acrescentou desta forma a irresponsabilidade civil e penal. Alcança quaisquer de suas opiniões, palavras e votos, exclui “no exercício do mandato”, “no exercício das funções do mandato” e não restringiu quanto ao crime contra a honra, inclusive por calúnia, difamação, injúria, ultraje à moral pública ou provocação pública ao crime.
O artigo 53 da CF, hodiernamente, dá uma amplitude maior à irresponsabilidade civil e criminal do parlamentar e por vontade do legislador constituinte derivado. Aceitável ou não é o que decorre dos textos apresentados. Conduz ao dilema: por um lado afasta-se de um regime autoritário, ditatorial e por outro leva ao abuso dos parlamentares.
(Footnotes) 1 FAVOREU, Louis et als.
Droit Constitutionnel, 3 eme ed., pp. 694 – 696 e 4 eme ed., pp 615 – 616.