A “Escola de Processo de São Paulo” foi fundada na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco por Liebman, o discípulo de Chiovenda que, exilado no Brasil, lecionou para os quatro notáveis discípulos que foram Alfredo Buzaid, Luiz Eulálio de Bueno Vidigal, José Frederico Marques e Benvindo Aires.

Coube a Liebman formular aquela que, na minha opinião, é a mais perfeita definição do Juiz de Direito que jamais foi enunciada. Com efeito, em seu “Manual de Direito Processualacacio 3 99597 Civil”, o jurista ensina que, livre de vínculos no exercício da sua função, o Juiz, todavia, é obrigado a observar a lei, da qual é o intérprete qualificado. Chamo a atenção para o ponto: Obrigado a observar a lei... Já tive a oportunidade de afirmar que ao se referir ao “intérprete qualificado da lei”, Liebman não desejou se referir, apenas, à qualificação técnica do magistrado, mas também aos seus atributos éticos e ao seu equilíbrio emocional. O Juiz é um cultor do Direito, e lembro que em Roma, berço da Ciência do Direito, os jurisconsultos eram chamados, também, de “prudentes.”

Estes dados eu os rememoro para abordar o que no Brasil ora ocorre no Supremo Tribunal Federal, órgão de superposição do Judiciário, guardião da Constituição e, “ipso facto”, guardião do Estado de Direito, além de garante das liberdades democráticas.

Advoguei por quase meio século e há muitos anos me encontro no magistério superior, em que leciono disciplinas jurídicas. E é com dor na alma que digo que o Pretório Maior, de há alguns anos para cá, ostenta a pior composição da sua história... e o que afirmo do STF se aplica, “mutatis mutandis”, ao Tribunal Superior Eleitoral.

A ideologia penetrou em ambos os tribunais. E a contaminação ideológica dos juízes prostituiu a toga, porquanto julgando com critérios ideológicos, os ministros deixaram de banda a imparcialidade. Já no Impeachment de Dilma Roussef este fenômeno foi observado, porquanto o Ministro Lewandoviski manteve os direitos políticos da Presidente afastada, contrariando expressa disposição de lei. A despeito do precedente citado, foi na eleição de 2022 que os nefastos efeitos da ideologia se fizeram sentir com mais intensidade, no comportamento dos membros do STF e do TSE. O antecedente imediato de tal comportamento foi a resistência não só inexplicável, mas até mesmo pânica, à emissão de comprovantes físicos dos votos depositados nas urnas eletrônicas. “A posteriori” Edson Fachin, numa decisão absurda, retirou “Lula” da cadeia, e o habilitou a ser candidato à Presidência da República. Na eleição propriamente dita, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, numa perversa metamorfose, deixaram de ser cortes de Justiça, para serem partidos políticos... isto desembocou no dado --- inescondível --- de que não houve um tratamento paritário para os dois candidatos finalistas. “Lula” era favorecido, ao passo que Bolsonaro era perseguido...

Finda a votação, ficou proibido questionar os resultados da eleição, o que contraria não só a ideia da transparência que deve imperar na Democracia, mas também o direito de petição aos poderes públicos!... Por fim, arvorado em “Censor Maximus” da “Res Publica”, Alexandre de Moraes passou a intimidar, com multas extorsivas, quem quer que se insurja contra os resultados de um pleito que foi acusado de irregular por várias perícias... a pá de cal da truculência e da arbitrariedade foi a grosseira resposta dada a um cidadão pelo Ministro Barroso, que, em Nova York, recorreu a uma linguagem de botequim para se referir a uma eleição presidencial.

Em síntese, a ideologia prostituiu a toga. E isto significa a morte da segurança jurídica para todos os brasileiros. Significa mais que, contrariando Liebman, os membros do S.T.F., em sua maioria, são intérpretes desqualificados da lei...

*Acacio Vaz de Lima Filho, um dos duzentos milhões de “Manés” deste país, é Livre-Docente em Direito Civil, área de História do Direito pela Faculdade do Largo de São Francisco, e Acadêmico Perpétuo da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Como “Mané”, é autor dos livros “O Poder Na Antiguidade”, “As Constituições Imperiais Como Fonte do Direito Romano”, “A Censura: Magistratura Moral da República Romana” e “Horizontes da História e do Direito – Estudos em Memória do Professor Miguel Reale”