O processualismo científico nasceu em 1868 com a publicação, na Alemanha, do livro “Teoria Das Exceções Dilatórias E Dos Pressupostos Processuais”, de Oskar Von Büllow. “A posteriori” --- e também na Alemanha --- Wach chegou à noção de “relação jurídica.” E foi com o processualismo científico que se chegou à concepção publicística do processo, com o abandono da velha concepção privatista, que vinha do Direito Romano. De acordo com a primeira, o Direito Processual, aí incluído o Direito Processual Civil, é um ramo do Direito Público, porquanto disciplina o exercício da Jurisdição, uma função eminentemente pública, e monopolizada pelo Estado.
Os avanços científicos mencionados acima foram divulgados nos países de línguas latinas por Giuseppe Chiovenda, e chegaram ao Brasil pela mão de Enrico Tullio Liebman, o corifeu da “Escola de Processo de São Paulo.” Uma das conquistas do processualismo científico é a ideia da índole eminentemente instrumental do processo, que existe para atuar a Jurisdição. Por outras palavras, o processo não é um fim em si mesmo: existe para que a função jurisdicional do Estado funcione bem.
No processo existem formas que devem ser obedecidas, tendo em mente a segurança jurídica de todos os que nele se envolvem. Por outro lado, ele não pode e não deve descambar para um estéril culto da forma pela forma. Ao tratar deste assunto, José Frederico Marques ensina que o processo não pode ser confundido com um amontoado de sutilezas euremáticas...
Tudo isto vem a propósito da recente decisão do Supremo Tribunal Federal que considerou o fôro da Justiça Federal de Curitiba incompetente para os processos da “Operação Lava Jato” movidos contra o ex-presidente Luiz Inácio da Silva, anulando o processado, e tornando o Réu potencialmente elegível no próximo pleito presidencial...
Salta aos olhos de qualquer transeunte da Praça de Sé que a decisão do S.T.F. não foi jurídica, sendo ao revés política. Tratou-se de, num passe de mágica, retirar de Luiz Inácio da Silva todo o seu passado de criminoso, habilitando-o, de novo, a saquear o Brasil com a sua quadrilha.
Admitida, para argumentar, a incompetência do fôro de Curitiba, e em nome do Princípio da Economia Processual, toda a instrução do processo, cara e demorada, deveria ser aproveitada. Além disto, “utile per inutile non vitiatur”, como reza o brocardo que pode ser traduzido aproximadamente assim: “O que é útil não deve ser prejudicado pelo que é inútil.”
Os integrantes do Supremo Tribunal Federal autores de um tal despautério não leram --- tenho certeza disto! --- a bela passagem de Liebman, em que o processualista chama o Juiz de “intérprete qualificado da lei.” É claro que o “qualificado”, aí, não significa, apenas, a qualificação intelectual. Liebman quer se referir, também, à investidura do Juiz e aos seus pressupostos.
Afirmo que não possuem ética tais membros do S.T.F. que, frustrando as expectativas de todos os brasileiros de bem, premiaram com a impunidade o metalúrgico bêbado e mau caráter que levou a corrupção no Brasil a um patamar jamais visto. Tratou-se de um supremo insulto à Pátria.
Uma última palavra sobre um homem digno, o ex-Juiz Federal Sérgio Moro: --- Tenho pena dele, um idealista que tentou viver, no Brasil, os valores da poesia épica de Homero e Vergílio. Esqueceu que esta não é a terra de Homero e Vergílio, mas a terra de “Fernandinho Beira Mar”, “Marcola” ,“Champinha”, “Elias Maluco” “et magna infectunque caterva”!...
*Acacio Vaz de Lima Filho é advogado e professor universitário, e Acadêmico Perpétuo da Academia Paulista de Letras Jurídicas