Francisco Pedro Juca 2 f4004Juiz do Trabalho Titular da 14ªVT/SP. Mestre, Doutor em Direito Privado pela PUC/SP e Direito do Estado pela USP. Livre-Docente em Direito Financeiro pela USP. Pós Doutorado na Universidade de Salamanca – Espanha. Professor Titular de Direito Constitucional da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP, do Corpo Permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Senso (Mestrado e Doutorado). Pertence à Academia Paulista de Letras Jurídicas – APLJ, Cadeira nº. 7, Patrono Sampaio Dória. Da Academia Paulista de Magistrados. Sociedade Paulista de Direito Financeiro e da Asociación Hispanobrasileña de Derecho Comparado. Associação Brasileira dos Constitucionalistas Brasileiros – Instituto Pimenta Bueno. Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Associação Internacional dos Constitucionalistas.

É polêmica em matéria trabalhista o tema da prescrição intercorrente, como sendo aquela que se opera já na fase de execução, pela inação do exeqüente ou pela impossibilidade de localização de bens penhoráveis, o que eterniza o processo no tempo, sem todavia qualquer resultado útil, sequer para as partes.

A matéria se torna mais complexa pelo choque (aparente) entre duas Súmulas, uma do Supremo Tribunal Federal (Súmula nº. 327): O Direito Trabalhista admite a prescrição intercorrente, e outra do Tribunal Superior do Trabalho (Súmula nº. 114): É inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente.

Antes se mencionou que o choque entre ambas é aparente, isso porque não existe na realidade jurídica em vigor, eis que a matéria prescricional na seara trabalhista está constitucionalizada, mercê do art. 7º, inc. XXIX, que contém: Ação quanto aos créditos resultantes da relação de trabalho com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.

Decorre da constitucionalização do instituto atrair jurisdição constitucional, com o que, em se tratando de dispositivo constitucional, o intérprete magno e definitivo é o Supremo Tribunal Federal, instância máxima da hermenêutica constitucional, e, como tal, seu intérprete privilegiado, o que significa dizer, aquele que por repartição constitucional de competências tem o mister de fixar o conteúdo e alcance das normas constitucionais. Ora bem, se assim é, desaparece a razão da discussão sobre o tema, vez que o Excelso Pretório tem sumulado o entendimento de aplicabilidade da prescrição intercorrente em matéria trabalhista, cabendo às instâncias inferiores, ainda que especializadas, homenagearem ao guardião constitucional, seguindo sua diretriz. Simplificar-se-ia o problema repetindo Roma locuta cessata questio.

Evaristo de Moraes Filho e Antonio Carlos Flores Moraes [1] chamam a atenção para as repercussões práticas da constitucionalização do direito decorrente do neoconstitucionalismo, fundando-se na reflexão autorizada de Luiz Roberto Barroso, para concluir:

“A partir de 1988, e mais notadamente nos últimos cinco ou dez anos, a Constituição Brasileira passou a desfrutar não apenas da supremacia formal que sempre teve, mas também, de uma supremacia material, axiológica, potencializada pela abertura do sistema jurídico pela normatividade de seus princípios. Com grande ímpeto, exibindo força normativa sem precedente, a Constituição ingressou na paisagem jurídica do País e no discurso dos operadores jurídicos”.

A reflexão colacionada do clássico demonstra, e à saciedade, que se vive o tempo antevisto por Konrad Hesse nos seus Escritos Constitucionais [2], da máxima eficácia das normas constitucionais, o que significa a extração dos maiores e mais intensos efeitos delas para concretizar a supremacia. Ora bem, se assim é, temos que o tema prescricional em matéria trabalhista deita suas raízes constitucionais diretas, e, exatamente por isso, a hermenêutica que obrigatoriamente deve prevalecer é a do guardião constitucional por excelência, que é o Supremo Tribunal Federal, consequentemente, não se trata de escolha entre as duas súmulas, mas o reconhecimento da hierarquia entre elas, com a superioridade daquela editada pela Corte Constitucional.

O aspecto relativo à aplicabilidade está vencido, como se demonstra, pela ocorrência da constitucionalização do instituto da prescrição e da fixação da interpretação dele pela Suprema Corte, todavia, não será excesso se trazer à colação algumas considerações adicionais, relativas ao aspecto infraconstitucional.

O parágrafo 5º do art. 219 do CPC, alterado pela Lei nº 11.280/06, dispõe que: “o juiz pronunciará de ofício a prescrição” e o § 1º do artigo 884 da CLT prevê que: "a matéria de defesa será restrita às alegações de cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou prescrição da dívida".

Desde logo é necessário deixar claro que a lei processual, ordinária ou comum, contida na Lei Processual Civil, seguramente curvando-se ao preceito de ordem pública derivado do princípio da segurança jurídica e da estabilidade e previsibilidade das relações e instituições, atribui ao prudente arbítrio do juiz (jurisprudência) pronunciar de ofício a prescrição, e a lei trabalhista, ao disciplinar a matéria de defesa em execução, contempla a figura da prescrição da dívida, cabendo aqui esclarecer o que significa. Ora, a dívida de que trata o dispositivo legal em comento é àquela resultante do título executivo judicial e a prescrição dele se opera pelo transcurso do tempo sem ação do exeqüente, ou pela inexistência de bens penhoráveis.

Também a leitura dos dispositivos infraconstitucionais deixa clara a aplicabilidade da prescrição intercorrente em matéria trabalhista, destacando-se a inexistência de palavras inúteis na lei.

É relevante acentuar dois aspectos. Primeiro, que o dispositivo acima trazido à colação resulta do movimento denominado de renovação (ou atualização) das normas processuais, voltado a adequar o processo às necessidades contemporâneas, do que decorre sua inteira pertinência como fonte subsidiária do processo trabalhista, considerados, tanto a ausência de disposição especial própria, quanto a compatibilidade sistêmica (inter e intra) das normas processuais.

A propósito, o tema não é novo em discussão, tanto que a lição magistral de Evaristo de Morais [3] enfrentando o assunto, na sua clássica Introdução ao Direito do Trabalho, remetendo à Tissier, resgatando as raízes francesas da doutrina jurídica nacional, acentua que a prescrição decorre da necessidade da estabilidade das situações e, consequentemente, da necessidade de segurança jurídica, contribuindo decisivamente para a necessária paz social, fim do direito (Jehering). E o faz aduzindo a Gabba, a propósito da doutrina da irretroatividade das normas, inaugurada pelo Código Civil Francês, de que a preservação do ato jurídico perfeito (lege tempo factun) do direito adquirido e da coisa julgada nada mais pretende do que proteger, como valor social relevante, as situações consolidadas pelo decurso do tempo, que ipso facto merecem a proteção da ordem jurídica.

“É sempre com fundamento na ordem e na segurança que se explicam e justificam a prescrição e a decadência. Sobreleva a tudo a certeza das relações jurídicas, da sua titularidade, com seus direitos e deveres. Beaudry-Lacantinerie et Tissier apresentam o interesse social como a razão de ser desses institutos extintivos, ficando a liberação presumida a renuncia do titular de um direito prescrito como motivos acessórios e secundários. Dizem eles: “Sem a prescrição não se teria mais segurança nos negócios, nem estabilidade nos patrimônios particulares, nem paz entre as pessoas, nem ordem do Estado.” E citam ainda estas palavras de Bigot-Préamineu, quando da elaboração do código civil de 1804: “A justiça geral é satisfeita; por conseguinte, se há interesses particulares que possam ser lesados, devem ceder diante da necessidade manter a ordem social.” A prescrição liberatória ou extintiva é um modo de liberação que resulta da inação do credor durante o tempo fixado pela lei (Tissier). Assim, com Câmara Leal, podemos dizer que quatro são os elementos integrantes ou as condições elementares para que ocorra a prescrição: a) existência de uma ação exercitável; b) inércia do titular da ação pelo seu não exercício; c) continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo; d) ausência de causas preclusivas de seu curso.”

Também no subsistema pertinente ao Direito do Trabalho deve ser assim, especialmente no aspecto processual, considerando que este é instrumento de solução de conflitos (meio de atuação da jurisdição)[4], sendo ilógico e contraditório que, no sentido oposto da solução do conflito e construção da paz, sirva para eternizar o conflito, manter em aberto situação indefinidamente independente do tempo, o que, a propósito, afronta direta e flagrantemente a preceito constitucional de direito fundamental que estabelece a “razoável duração do processo”.

Por derradeiro, considere-se que descabe ao Judiciário e ao Processo, esterilmente, manter em curso demanda que jamais chegará ao termo pelo desaparecimento do réu ou de seu patrimônio. Tem-se nestes casos, que são numerosos, a manutenção inútil da falsa esperança de que num futuro incerto, talvez, se obtenha a concretização do direito. Enquanto isso permanece a incerteza, a insegurança das relações, especialmente em relação a terceiros estranhos a relação litigiosa, nada mais do que isso, que além de tudo concorre fortemente com o enfraquecimento e desprestígio do direito e da jurisdição, minando a credibilidade social pela ineficácia.

Não será demais aqui referir que a jurisdição, em situações tais que cumpriu a sua função constitucional porquanto “disse o direito”, restaurou a integridade da ordem jurídica, fez prevalecer o mandamento. A impossibilidade, tanto material quanto jurídica, diz respeito à segunda parte: cumprimento da decisão. Ora, o direito tem limites de possibilidades e, assim, também o Estado, aplicado o princípio da razoabilidade, o da ponderação e, sobretudo, o da possibilidade material, constata-se esgotada a ação estatal. É o limite.

O Jurista José Rogério Cruz e Tucci em recente artigo publicado no site Consultor Jurídico - CONJUR [5], examinando o tema, reflete:

“...a meu juízo, não pode ser admitida com tamanha amplitude, pois atenta contra o objetivo principal do sistema jurídico que é a pacificação dos conflitos de interesse. Como é cediço, o instituto da prescrição tem por fundamento a segurança jurídica proporcionada às relações jurídicas, fulminando a pretensão pelo transcurso do tempo associado à inércia do credor...esse objetivo de pacificação social não parece ser compatível com prolongamento indefinido de pretensões executórias ao longo do tempo. Quanto a esse ponto no caso dos autos é emblemático, pois a execução permaneceu suspensa por treze anos (de 1999 a 2012), sem qualquer iniciativa da parte credora, quando então os devedores, pretendendo livrarem-se do débito, requereram a declaração da prescrição intercorrente, que teria sido consumada após cinco anos de suspensão do processo, por se tratar de dívida líquida (conf. art. 206, parágrafo 5º, inc. I, Código Civil) Evidentemente, é mais salutar para o sistema jurídico manter a pacificação social do que manter a eficácia do crédito por tempo indefinido.”

Dessarte, impossível rechaçar o acolhimento (inelutável, lógico, jurídico e razoável) do instituto da prescrição, mormente quando, por incúria, desatenção ou pouca sorte, a parte titular do direito, defensor do interesse, não conseguiu realizar o que lhe competia, “dormientibus non socurrit jus”. É o caso.

O jurista Sérgio Pinto Martins, em recente acórdão, observou que:

“A prescrição de que trata o parágrafo 1o do artigo 884 da CLT só pode ser, porém, a prescrição intercorrente, quando a parte vai alegá-la nos embargos. Assim, a própria CLT regula a matéria, não há como se aplicar o artigo 40 da Lei no 6.830/80. Não há omissão na execução para se aplicar a lei de execução fiscal (art. 889 da CLT), que é a Lei n.º 6.830/80.

O parágrafo 4.º do artigo 40 da Lei n.º 6.830/80 prevê expressamente a aplicação da prescrição intercorrente na execução. (Acórdão 20150031122, TRT02, Desemb. Relator Sérgio Pinto Martins, data de publicação em 27/05/2015.)”

O que não se pode aceitar é que o impulso oficial, a inquisitoriedade do processo do trabalho, indo além da substitutividade da jurisdição e em nome da tuitividade trabalhista, supra as deficiências da parte, saneie sua incúria, especialmente quando, como na maioria dos casos, está sob o patrocínio técnico de advogado que, por sua natureza, atende à igualdade das partes. A substitutividade da jurisdição não significa, e nem pode significar, substituir a diligência da parte na defesa do interesse que é seu, sob pena de estimular a incúria, a desatenção, o descuido, porque o “Estado-Juiz maternal tudo fará, tudo proverá, sem que o titular da pretensão faça senão esperar comodamente.

Não resta nada senão, como demonstrado, acolher e aplicar a prescrição intercorrente, assente com a doutrina do Excelso Pretório, extinguindo o feito, ad argumentadum tantum. Inserido no texto constitucional o princípio da razoável duração do processo, tal elemento também há de entrar em ponderação na formulação da norma concreta gerada no, pelo e para o processo.

Com efeito, o crédito trabalhista é alimentar e tem privilégios, inclusive sobre os créditos fazendários, porém, no estado de direito democrático não existe direito absoluto, há a natural limitação recíproca da articulação interativa e sistêmica entre eles, estando aí incluídos os princípios tão prestigiados pelo neoconstitucionalismo. O que se infere é a propriedade da sumulação da suprema corte, porquanto, admitir a relação jurídica processual eterna, pendente de fato incerto e indefinido, é negar a natureza do próprio direito, é impropriedade lógica até, e, sob o aspecto material e concreto, o que se entrevê é a cruel venda de ilusão, fomentando a expectativa de um fato futuro impossível pela realidade dos fatos.

Por isto mesmo, como acentua Tissier [6] relembrado na clássica Introdução do Direito do Trabalho de Evaristo de Moraes, ambos antes referidos, a relação entre o tempo e o direito pressupõe a necessidade humana da segurança jurídica e da estabilidade nas relações, e, por certo, este foi o sábio enfoque da Suprema Corte Brasileira no sentido de prestigiar a viabilidade processual de concretização como sendo a possibilidade material real de o processo produzir os seus efeitos no mundo da realidade. É assim que, acompanhando o STF, guardião constitucional por excelência, que se decreta a ocorrência da prescrição intercorrente no caso concreto, fundando na Súmula ao norte referida.

O que resta a fixar, a esta altura, diz respeito a prazo e termo, o que também, diga-se, não é problema real, senão vejamos.

O dispositivo constitucional ao norte invocado fixa o prazo prescricional geral em matéria trabalhista, em cinco anos. Este prazo é repetido pela lei de execuções fiscais, fonte subsidiária primeira na execução trabalhista, conforme estabelece o art. 889, ora, o art. 40 da LEF estabelece o prazo também de cinco anos.

“Art. 40 da LEF - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. 4o - Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. 5o - A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4o deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda.”

Assim, a fonte subsidiária resolve o problema. Primeiro, tem-se fixado o prazo prescricional de cinco anos, coincidindo este lapso temporal estabelecido na citada Lei e aquele do dispositivo constitucional também colacionado.

Apenas em abono a tese, não é excesso referir que a doutrina jus laboral autorizada admite o instituto da prescrição intercorrente, como se ilustra:

“Antonio Lamarca [7] declara que “quando a lei fala em prescrição da dívida, refere-se, incontedivelmente, à prescrição superveniente à dívida constante da sentença exequenda.”

Wagner Gigli [8] também entende aplicável a prescrição intercorrente no processo do trabalho: “a quitação e a prescrição referidas pelo texto legal são apenas as que se efetivarem depois da sentença, vez que as anteriores constituíam matéria de discussão na fase cognitiva, já superada: reabrir a discussão seria ofender a coisa julgada”.

Leciona Valentin Carrion [9] que “paralisada a ação no processo de cognição ou no da execução, por culpa do autor, por mais de dois anos, opera-se a chamada prescrição intercorrente; mesmo que descabido ao Juiz velar pelo andamento do processo (CLT, art. 765), a parte não perde, por isso, a iniciativa; sugerir que o Juiz prossiga à revelia do autor, quando este não cumpre os atos que lhe foram determinados, é como remédio que mata o enfermo. Pretender a inexistência da prescrição intercorrente é o mesmo que criar a ‘lide perpétua’ (Russomano, Comentários à CLT), o que não se coaduna com o direito brasileiro”.

Amador Paes de Almeida [10]  também informa que “a prescrição a que se refere o §1.ª do art. 884 da Consolidação das Leis do Trabalho é a prescrição intercorrente, ou seja, aquela posterior ao julgado que se executa”.

Manoel Antonio Teixeira Filho [11] assevera que a prescrição da dívida a que se refere o parágrafo 1.º do artigo 884 da CLT é a prescrição intercorrente.

Carlos Henrique Bezerra Leite [12]  afirma que é “aplicável a prescrição intercorrente no processo do trabalho, como, aliás, prevê o art. 884, §1.º da CLT, que consagra a prescrição como matéria de defesa nos embargos à execução. Ora, tal prescrição só pode ser a intercorrente.

A prescrição de que trata o parágrafo 1.º do artigo 884 da CLT é a intercorrente. Não existe omissão na CLT para se aplicar o artigo 40 da Lei n.º 6.830/80. Não se aplica, portanto, a Súmula 114 do TST, mas a orientação do STF (Súmula 327), que admite a prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho.

O interessado deveria provocar o juízo. A exceção estabelecida pelo artigo 878 da CLT, quanto à possibilidade de execução pelo próprio juiz, ex officio, ocorre quando haja elementos suficientes nos autos para localização da executada, os quais devem ser fornecidos pelo exequente, o que não ocorreu in casu. Trata-se, ainda, de faculdade e não de obrigação do juiz.” (Acórdão 20150031122, TRT02, Desemb. Relator Sérgio Pinto Martins, data de publicação em 27/05/2015.)

Acompanhando à elaboração doutrinária (como soe), a jurisprudência começa a sensibilizar-se, seguindo a este mesmo sentido, como se ilustra com os arestos a seguir:

“AGRAVO DE PETIÇÃO TRT/SP 01796004019985020011 3ª TURMA Prescrição da pretensão executiva. Inobstante os termos da Súmula 114 do C. TST, que dispõe ser inaplicável no processo do trabalho a prescrição intercorrente admito, com fundamento na Súmula 327 o Supremo Tribunal Federal, que o Direito do Trabalho permite a prescrição da pretensão executiva naquelas hipóteses em que a paralisação do andamento do processo se dá em razão da inércia do interessado (TRT 2ª R., 3ª T., PROCESSO TRT/SP nº 01796004019985020011, Rel. Design. Ana Maria Contrucci Brito e Silva, DJ1.8.2014”

“Execução. Prescrição intercorrente. Não há omissão no parágrafo 1º do artigo 884 da CLT para se aplicar o artigo 40 da Lei n.º 6.830/80. Aplica-se, portanto, a prescrição intercorrente no processo do trabalho Proc. n.º 00576.2002.5.02.0341 (20110329648), Rel. Sergio Pinto Martins, DJ 17.6.2011).

Proc. 0274000-52.2004.5.02.038, Rel. Maria Cristina Fisch;

Proc. 0155700-55.2000.020432, Rel. Lílian Gonçalves;

0215200842002502043, Rel. Regina Maria Vasconcelos Dubugras”

“PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - APLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO CONSUBSTANCIADO NO ENUNCIADO Nº 114/TST - CONDIÇÕES: Conquanto o Enunciado nº 114/TST genericamente negue a aplicabilidade do instituto da prescrição intercorrente no processo trabalhista, tal premissa deve ser avaliada em cotejo com as circunstâncias fáticas de cada caso, porquanto não é compatível com os ideais de economia e agilidade na entrega da prestação jurisdicional o manter-se semelhante critério diante de situações nas quais se dá o estancamento do feito por inércia da parte em praticar atos de sua responsabilidade e interesse. Revista conhecida e não provida. (5ª T., RR - 345154-21.1997.5.09.5555, j. 3/11/1999, Rel. Min. Armando de Brito, DJ 3/12/1999)”

Resta enfrentar o termo inicial. Ora, como disposto na lei de execuções fiscais, com as ressalvas que se fez, quando esgotadas as possibilidades do impulso oficial relativo às diligências e persecução de bens do devedor e sua localização, é de notificar-se o exequente para indicar, em um ano, novos meios, com o que o termo inicial do prazo é o da notificação ao exequente. Vencida também esta matéria.

Vencido o prazo de um ano, é novamente feita a notificação, desta feita tanto ao exequente, quanto ao executado, contando-se, desta notificação, cinco anos, após os quais, não havendo indicação de bens ou localizado o executado, dando-se a inércia do exequente, tem-se operada a prescrição intercorrente, com o que é de se extinguir o processo de execução e arquivar, por findos, os autos, com o que há consonância com o magistério de José da Silva Pacheco no clássico Comentários à Lei de Execução Fiscal:[13]

“Ela se caracteriza pela ocorrência dos seguintes fatos: a) ter havido execução fiscal com base em certidão de dívida ativa; b) não ter sido encontrado devedor ou seus bens para a penhora; c) suspensão do curso da execução enquanto não localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais recair a penhora; d) abertura de vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública; e) decurso do prazo de um ano, sem que seja localizado o devedor ou seus bens penhoráveis, e, consequentemente, arquivamento dos autos, por despacho do juiz; f) permanência do processo arquivado, sem ter sido encontrado o devedor ou seus bens penhoráveis, por mais de cinco ano, o que implica presunção de inércia do credor e consequente prescrição, que pode ser reconhecida e decretada ex officio pelo juiz, após ouvida a Fazenda Pública, a fim de evitar o absurdo de tornar indefinido o prazo prescricional desse órgão.

Com a introdução do §4º ao art. 40 da Lei n. 6.830/80, ocorrida por força do art. 6º da Lei n. 11.051/2004, ficou explícito que pode o juiz, após a audiência da Fazenda Pública, reconhecer, de ofício, a prescrição intercorrente e decretá-la, imediatamente, se da decisão que ordenar o arquivamento tiver ocorrido o prazo prescricional de cinco anos.”

No caso concreto, desde a ciência da necessidade de indicação de novos elementos para seguimento da execução, que equivale à notificação antes prevista e referida, quando transcorridos mais de cinco anos, é, assim, de se aplicar o parágrafo 4º do citado dispositivo, pronunciando a ocorrência da prescrição intercorrente e determinando a extinção do feito, com o arquivamento dos autos. Tal se conclui observando que o emprego ou utilização da fonte subsidiária, que naturalmente tem caráter de supletividade porque complementa, aperfeiçoa, ajusta, noutras palavras, faz o papel de colmatação de insuficiência normativa da fonte principal que, pela sua própria natureza, implica em ajustamento e compatibilização (especialmente teleológica) da fonte subsidiária à principal, aquele deve e precisa ajustar-se a esta.

É nesta configuração que se impõe rememorar os princípios informadores e conformadores, os quais, no dizer de Mascaro Nascimento,[14] são inerentes ao Processo do Trabalho, pertencendo à essência mesmo da sua natureza. Dessarte, a importação do instituto no seu aspecto processual, desde a lei processual fiscal, necessariamente precisa adequar-se a tais princípios, especialmente o da instrumentalidade das formas, da mitigação do formalismo, da concentração e da celeridade.

Considerados os dois primeiros, temos que no processo do trabalho o norte preponderante é a finalidade e o objetivo do ato processual praticado, remetendo-se à forma aquilo absolutamente indispensável, com o que se acentua fortemente o caráter instrumental do processo e, por consequência da regra processual, portanto, direcionado à finalidade da pacificação social pela solução jurídica do conflito, o conjunto de atos há de ser realizado com eficácia máxima e utilidade plena. Considerados os dois segundos, temos que a prática e realização destes atos, sempre mirando a eficiência e a economia processual, devem ser concentradas e céleres.

Com a aplicação dos princípios processuais invocados é possível fixar a interpretação razoável e lógica do art. 40 da LEF em matéria trabalhista de que, esgotados os meios de persecução patrimonial do devedor, aplicada a desconsideração da personalidade jurídica e demais modos de responsabilização patrimonial e uma vez notificado o exequente para indicar os meios para o prosseguimento da execução, tem-se fixado o termo inicial do prazo prescricional quinquenal, findo o qual, voltando-se a notificá-lo, tem-se consumada a prescrição e a consequente extinção do processo, relembrando o transcurso de mesmo prazo estabelecido na Constituição e na LEF de cinco anos, porquanto a obrigação exequenda nasce com o título executivo judicial instrumentado pela decisão passada em julgado, com liquidez e certeza.

Com isso se demonstra primeiro o cabimento da prescrição intercorrente em matéria trabalhista, depois a forma de sua concretização processual, e terceiro, os critérios de fixação de termos inicial e final do prazo. Destarte, em síntese com fundamento no demonstrado, temos que o termo inicial é a data da notificação do exeqüente para indicar os meios para ao seguimento da execução, o termo final é o quinto ano dessa notificação, com o que se tem operada a prescrição intercorrente, cuja declaração se deve dar pelo Juízo da Execução, do que é conseqüência a extinção do processo e seu arquivamento definitivo pela liberação da obrigação fundante da execução, arrematando que assim é porque desde sempre a execução é fase do processo trabalhista, porquanto não se constituiu, como regra, em processo autônomo, salvo na hipótese dos títulos executivos extrajudiciais que têm rito próprio, sem fase cognitiva exauriente.

Com estes elementos atende-se à segurança jurídica, à estabilidade das relações jurídicas, à previsibilidade da jurisdição e concretiza-se a razoável duração do processo, esta última absolutamente incompatível com a “eternização” do processo e, consequentemente, do litígio e do estado de conflitividade, absolutamente contrário à paz social, finalidade razão de ser da Justiça do Trabalho.

Apenas para estabelecer os limites mais precisos do tema e da abordagem feita, é interessante destacar que não se acolhe a prescrição intercorrente bienal, entendendo que não encontra guarida na ordem jurídica nem em boa construção hermenêutica porque o mesmo dispositivo constitucional invocado (art. 5º da Constituição Federal) ao assinalar o biênio do encerramento da relação de emprego para o ajuizamento da reclamação trabalhista, em nosso modestíssimo ver, não é exatamente prescrição, porque não alcança diretamente o direito material, mas, diversamente, fulmina apenas e tão somente o direito de ação, com o que configura a hipótese da decadência, já que obsta ao exercício do direito subjetivo público abstrato de demandar em juízo direitos de natureza trabalhista, remetendo, quando muito, tais direitos eventualmente existentes e insatisfeitos, à condição de obrigação natural, tal como o determina o Direito Civil.

*PUBLICADO EM Da Prescrição Intercorrente em Matéria Trabalhista. Revista Jurídica da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região. , v.03, p.55 a 59 - 59, 2015.

[1] in Introdução ao Direito do Trabalho, ed. LTr.2014, p.113

[2] Ed. Saraiva, SP, 2.012

[3] op.cit.p.186/7

[4] Chiovenda

[5] TUCCI, José Rogério Cruz e. Revista Digital Consultor Jurídico, site: www.conjur.com.br : Coluna: Paradoxo da Corte, data de 03/11/2015, 8h00.

[6] Course de Droit Civil, tome I.

[7] LAMARCA, Antônio. Execução na Justiça do Trabalho. São Paulo: Fulgor, 1962, p. 168/9.

[8] GIGLIO, Wagner. Direito Processual do Trabalho. 16ª ed. São Paulo, 2007, p. 587.

[9] CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leios do Trabalho, 33º edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 84.

[10] ALMEIDA, Amador Paes de. Curso Prático de Processo do Trabalho, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 398.

[11] TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Execução no Processo do Trabalho, 4ª ed. São Paulo: Ltr, 1994, p. 258-259.

[12] LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, 8ª ed. São Paulo: 2013, Ltr, p.

[13] PACHECO, José da Silva. Comentários à Lei de Execução Fiscal, 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 355.

[14] Processo do Trabalho