Liberdade e proteção do mandato
As imunidades estão previstas no artigo 53 e seus oito parágrafos da Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Elas visam assegurar a liberdade de ação aos parlamentares quando no exercício de seus mandatos. Em decorrência estes têm prerrogativas, as quais na verdade são exceções ao regime comum, cujo objetivo é o interesse público e não o pessoal do parlamentar. Cria-se assim condições para o bom exercício do mandato com o uso de prerrogativas irrenunciáveis1. As imunidades têm por fim a proteção do mandato contra perseguições judiciárias abusivas, permitindo total liberdade de pensamento e de ação, mas não devem conduzir à impunidade do parlamentar ao tratar da irresponsabilidade e da inviolabilidade2.
A irresponsabilidade está prevista no artigo 53, caput, da Constituição brasileira:
“Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos”.
Embora o texto fale em inviolabilidade, revela a irresponsabilidade. Protege o parlamentar, devido à necessidade de defender livremente suas opiniões, palavras e votos. Não podem ser responsabilizados por injúria e difamação. Corresponde ao artigo 26 al. 1 da Constituição francesa, com uma diferença que esta expressa “no exercício de suas funções”. Abrange aqui os atos ligados ao mandato, como os debates em sessões, os trabalhos nas comissões, nas missões confiadas pela assembléia, conteúdo dos relatórios etc.; ao contrário não cobre as atividades políticas habituais, como os discursos em reuniões públicas, artigos de imprensa etc3. No Brasil a omissão no texto de “no exercício de suas funções” poderá conduzir a uma amplitude maior da irresponsabilidade fora do exercício da função parlamentar.
A inviolabilidade, que na França também está abrigada no artigo 26 al. 1 e al. 2 da Constituição, no Brasil encontra-se no § 2º do artigo 53:
2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.
● § 2º com redação determinada pela Emenda Constitucional n. 35, de 20-12-2001.
É uma imunidade para evitar que o parlamentar seja materialmente impedido de exercer o seu mandato. Limita as prisões a atos estranhos ao exercício das funções, como crimes ou delitos.
Na França, antes de 1995, era preciso um voto da Assembléia, salvo em caso de flagrante delito. A revisão constitucional de 4 de agosto de 1995, modificou o regime de inviolabilidade e o exame de um parlamentar pode parcialmente ser feito sem intervenção da Assembléia ou de seus órgãos. São os processos ordinários que não envolvem restrições à liberdade e os dos crimes ou dos delitos flagrantes. Após 1995, a prisão, a medida privativa ou restritiva é o “bureau” da assembléia que autoriza e não mais a própria assembléia.
Isto significa, no Brasil, ao contrário da Constituição francesa, que mesmo nos casos de flagrante delito, os autos devem ser encaminhados e por voto da maioria absoluta, a Casa e não a mesa diretora, à qual pertence o parlamentar deve resolver sobre a prisão.
Dada a extensão do assunto continuaremos na próxima semana.
Notas:
1 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional, p. 174.
2 FAVOREU, Louis e als. Le droit constitutionnel des institutions, p. 694-696.
3 Idem, p. 695.
Prof. Dr. Dircêo Torrecillas Ramos*