Kiyoshi Harada 2 0e052

A Ministra Rosa Weber, uma das mais destacadas da Corte Suprema pela sua coerência na atuação, respeitando o princípio da colegialidade, está presidindo uma audiência pública para ouvir os membros do Ministério Público, representantes de entidades médicas e religiosas, além de representantes de ONGs a respeito do aborto até a 12ª semana de gestação. Por que não até 2ª, 3ª, 5ª ou 15ª semana?

Qual o objetivo dessa inusitada audiência pública? O resultado dessa audiência pública irá nortear futuros julgamentos da Corte envolvendo esse tema? Irá conferir nova interpretação aos textos constitucionais e legais com fundamento nos resultados da oitiva de um punhado de pessoas selecionadas? Irá estender a faculdade de aborto fora das duas hipóteses (estupro e risco de morte da mãe) permitidas pela jurisprudência?

Ou será que é para fundamentar a alteração constitucional por via de uma Assembléia Nacional Constituinte exclusiva a ser convocada oportunamente?

Já participei de inúmeras audiências públicas na Câmara dos Deputados para enriquecer os debates de diversos projetos de lei, mas, nunca para discutir eventual sentido que se possa emprestar a uma lei em vigor.

O direito à vida uterina ou extra uterina está protegido em nível de cláusula pétrea pelo art. 5º da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos”. A Constituição não diz “direito à vida, exceto da do nascituro”. O Código Civil, igualmente, coloca a salvo, “desde a concepção os direitos do nascituro” (art. 2º).

Logo, a Corte não tem que ouvir representantes da sociedade para direcionar o seu julgamento em cada caso concreto. Deve aplicar simplesmente os textos constitucionais e legais vigentes. Se for para subsidiar eventual alteração legislativa, o STF estará usurpando atribuição de outro Poder, no caso, a da Assembléia Nacional Constituinte, porque o Poder Reformador não poderá alterar os direitos e garantias fundamentais (art. 60, § 4º, IV da CF).

Essa audiência pública é tão esquisita quanto aos voos espetaculares dos Excelentíssimos Senhores Ministros da Suprema Corte sobre as terras indígenas, com o fito de subsidiar o julgamento e decisão da questão sobre a demarcação contínua de faixas!

Mas, já que a audiência pública está acontecendo seria oportuno que alguém se lembrasse de levar àquela Alta Corte de Justiça do País as chocantes imagens de fetos se contorcendo, desesperadamente, sem poder gritar, buscando proteção no interior do útero para não ser sugado impiedosamente por modernos equipamentos de aborto, manejados por frios profissionais desprovidos de sentimentos que lembrem a sua condição de humano!

* Acadêmico da Academia Paulista de Letras Jurídicas ocupando a cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira).