A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, após o período militar no governo, representava uma série de circunstâncias, como ponto de partida da Nova República.
Hodiernamente, decorridos trinta anos, assistimos o fim de um ciclo lulopetista. Curiosamente, através da escolha popular, teremos militares na Presidência da República, na Vice-Presidência, no Senado o de maior votação do País, em Executivos de Estados (membros da Federação e nos Legislativos federal, estadual, considerando, também, nos Municípios), eleitos nas disputas anteriores para prefeitos e vereadores.
Qual a situação atual? Um conjunto de circunstâncias condiciona a governabilidade, sugerindo mudanças estruturais, comportamentais, ensejando, uma expectativa de evolução a remover obstáculos e solucionar problemas. Não será fácil!
A Constituição cidadã, já com 105 Emendas, reclama reformas de subsistemas inseridos no sistema e outras revisões pontuais, através de novas Emendas. Temos aqui dificuldades, processuais-legislativas e políticas, a serem ultrapassadas. Para aprovar seus projetos, o governo necessita três quintos dos votos em cada casa do Congresso e em dois turnos, conforme artigo 60, § 2º, da Constituição Federal, desde que não esteja em vigência a intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio. São necessários, portanto, 308 votos dos Deputados Federais e 49 dos Senadores.
Inolvidável que algumas das propostas envolvem cláusulas pétreas e não serão objeto de deliberação quando tendentes a aboli-las, como manda o artigo 60, § 4º, CF. Lembremos que abolir não significa melhorá-las. Ocorre que, embora a Lei Magna expresse direitos e garantias individuais e apresente um capítulo, o I, destinado aos “Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”, entre os “Direitos e Garantias Fundamentais, do Título II, resolveu-se petrificar, além dos individuais, os direitos fundamentais, os humanos e quase toda a Constituição. Afasta-se daquele núcleo essencial da Lei Fundamental da Alemanha (1) e dificulta revisões, a não ser que seja aceita uma nova leitura para as cláusulas pétreas. Outra complicação surge quando necessária a Lei Complementar para regulamentação de dispositivos constitucionais, porque exige maioria absoluta, conforme artigo 69, CF., ou seja, 257 votos, da representação popular, e 41 votos da representação dos Estados da Federação.
Lado outro, as modificações necessárias, contrariam interesses e necessitam uma base de apoio sólida, para implementá-las. Dependem da conformação: situação/oposição; esquerda/ direita; não PT/ PT. O partido eleito para a presidência, procura, assim como os demais, a adesão dos eleitos, sem partido, que poderão pedir transferência porque suas siglas foram atingidas pela cláusula de barreira. Convém lembrar que o partido do presidente eleito perdeu seis ou sete cadeiras, devido a seus candidatos que não alcançaram a cláusula de desempenho e poderia ter a maior bancada, no lugar da segunda.
Enquanto procuram o apoio suficiente e dizem ter alcançado o exigido para as transformações e governabilidade – metade da Câmara (256 de 513); Senado (33 de 81); Governadores (16 de 27); regiões (4 de 5) –, a oposição conseguiu 140 Deputados, 13 Senadores e paralelamente assistimos a formação do novo Centrão: 117 Deputados Federais de 513 e 35 de 81 Senadores. Será que este reunirá força decisiva? Terá a vontade política e uma conduta com o fim do bem comum ou visará interesses particulares, corporativos, emendas parlamentares impositivas, crescentes, ministérios, cargos, estatais, ONGS, na base do toma lá, dá cá em relação ao apoio, pretendendo mais do mesmo? Os fatos apresentam, ainda, duas frentes de esquerda na oposição: PT de um lado e os demais do outro. Essas correlações de forças estão em formação e serão avaliadas adequadamente.
Dependendo do resultado, como serão as soluções governamentais? Terão maioria? Caso contrário, serão negociadas? Diante de oposição sistêmica e/ou troca-troca viciado, haverá imposição com apoio popular?
Daremos continuidade na próxima semana.
* Nota: 1. ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales, pág. 291, citando Häberle. Lei Fundamental da Repúblia federal da Alemanha, art. 19.2
Graduado pela PUC-SP; Mestre, Doutor, Livre-Docente pela USP; professor convidado PUC-PÓS; foi professor na FGV por 25 anos; membro do Conselho Superior de Direito da Fecomercio; membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas (APLJ); membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP); International Political Science Association (IPSA); American Political Science Association (APSA); e correspondente do Centro para o Estudo do Federalismo – Philadelphia (EUA); foi vice-Presidente da Associação Brasileira dos Constitucionalistas; presidiu várias comissões na OAB.
Autor dos Livros: Autoritarismo e Democracia; Remédios Constitucionais; O Controle de Constitucionalidade por Via de Ação; Federalismo Assimétrico e A Federalização das Novas Comunidades – A Questão da Soberania.
Coordenador e coautor de dezenas de obras, possui mais de 800 artigos publicados em jornais, revistas e livros do Brasil e exterior.