Fonte: Correio Braziliense 20/2/2019
Custo Brasil é o conjunto das dificuldades burocráticas, estruturais e econômicas que entravam o desenvolvimento. Encarecem o investimento e o custo dos produtos, aumentam o desemprego, a economia informal, a sonegação de impostos e a evasão de divisas.
A burocracia tem peso significativo na composição do custo Brasil: a criação ou o fechamento de uma empresa, as exigências excessivas para exportação e importação, a elevada carga tributária (eivada de exigências formais que aumentam o ônus das empresas), os altos custos e exigências contidos na legislação trabalhista e previdenciária, o sistema tributário complexo e ineficiente, acarretando uma das maiores cargas tributárias do planeta, o elevado déficit público, o peso desmesurado das despesas de custeio da máquina pública e a corrupção vergonhosa. São exemplos que diferenciam comparativamente os produtos brasileiros dos fabricados no exterior.
Combater os excessos burocráticos é imprescindível para o desenvolvimento. O Conselho Superior de Estudos Avançados da Fiesp escolheu esse tema para os estudos que está realizando, focando-o nos diversos aspectos. O presidente do Instituto Hélio Beltrão, Piquet Carneiro, sustenta que o excesso de trâmites legais atravanca a vida dos cidadãos, afeta a competitividade nacional e abre as portas para a corrupção.
No estudo que apresentou ao conselho, citou a frase do saudoso ministro Hélio Beltrão: "O brasileiro é simples e confiante. A administração pública é que herdou do passado e entronizou em seus regulamentos a centralização, a desconfiança e a complicação”. Hélio Beltrão (1916-1977) encampou o Programa Nacional de Desburocratização. A sua frase traduz o pântano burocrático que dia apôs dia os brasileiros precisam transpor. Para adquirir um bem, iniciar um empreendimento, viabilizar uma transação financeira ou tirar um simples documento, o cidadão tem de lidar com uma infinidade de papéis, carimbos, filas de cartório e má vontade dos burocratas de plantão.
A burocracia excessiva promove a exclusão social e econômica, na medida em que a maioria dos brasileiros não conhece nem metade das formalidades que deve cumprir. Ela está na raiz da negação de acesso aos direitos mais básicos. Piquet Carneiro apresentou uma relação que poderia servir de parâmetro ao governo, sempre que alguém sugere a colocação de mais uma fileira de tijolos no edifício da burocracia. Entre as questões a serem previamente analisadas, incluem-se: O problema a ser regulado está claro? Justifica-se a intervenção do governo? A regulação é a melhor medida no caso? Há base legal para proceder à regulação? Há benefícios que justifiquem a ação? Como os resultados serão atingidos?
No Brasil, a burocracia é responsável pela morosidade na área do comércio internacional tanto na exportação quanto na importação, o que toma difícil a concretização de negócios. Os trâmites para exportar são maiores aqui que nos países cujos índices de competitividade melhoraram. (Na América Latina, só perdemos para a Venezuela.) Não só. O mal também se faz presente em outras áreas negociais—cumprimento de contratos, abertura e fechamento de empresas, obtenção de crédito, registro de propriedade e iras obrigações tributárias.
Alan Greenspan, ex-chairman do Federal Reserve Board (FED), relata que a desregulamentação foi o grande feito pouco exaltado do governo Gerald Ford. Menciona como os negócios eram engessados nos Estados Unidos naquela época. E cita os setores: aviação civil, transporte rodoviário de cargas e de pessoas, oleodutos, telefonia, televisão, corretagem de ações, mercados financeiros, instituições de poupança e empresas de utilidade pública. No lançamento do programa, o presidente Ford prometeu que quebraria as algemas que tolhem as pessoas de negócios e que tanto quanto possível afastaria o governo federal dos negócios, da vida, dos bolsos e dos pés das pessoas. Greenspan realça que muitos de seus benefícios só ficaram claros depois de alguns anos.
No Brasil, muito ainda precisa ser feito: reforma do Judiciário, simplificação dos procedimentos de abertura de empresas, redução de assimetrias de informação no mercado de crédito, implementação do cadastro positivo, construção de garantias, informação sobre créditos mais segmentadas, reforma tributária. Os estados e municípios devem ser os grandes agentes de transformação. É preciso desatar o nó da burocracia se quisermos acelerar o desenvolvimento.
Ruy Altenfelder: Presidente do Conselho Superior de Assuntos Avançados (Consea/Fiesp) e da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Membro doa Comissão de Ética Pública da Presidência da República