Fonte: Correio Braziliense 18/3/2019
Charles de Montesquieu nasceu em 18 de janeiro de 1689 em Bordeaux, França, e morreu em 10 de fevereiro de 1755, em Paris. Foi político,filósofo e escritor, ficou famoso pela sua Teoria da Separação dos Poderes, incluída em muitas constituições internacionais, inclusive a brasileira. A teoria da Tripartição dos Poderes do Estado foi desenvolvida por Montesquieu no livro O Espírito das Leis, escrito em 1748. O autor partia das ideias de John Locke, cerca de um século antes. A tese da existência de três poderes remonta a Aristóteles. Montesquieu dividiu os poderes separando-os em Executivo, Judiciário e Legislativo.
As Constituições brasileiras acolheram a tese montesquiana. A Constituição cidadã de 1988, em seu artigo 2° ,dispôs que os Poderes são independentes e harmônicos entre si, tornando tal disposição cláusula pétrea (artigo 60, par.4°, III). Tal determinação estaria sendo observada nos tempos atuais?Vejamos: o Executivo, com fundamento nos artigos 50-V e 62 da Constituição Federal ,editou centenas de medidas provisórias,a maioria delas sem os requisitos indispensáveis de relevância e urgência.
O Congresso Nacional teve suas pautas travadas, paralisando os trabalhos legislativos.E o que é mais grave: na tramitação de muitas das medidas provisórias, foram acolhidas emendas que nada tinham a ver com o cerne das mesmas, verdadeiras“emendas piratas”desnaturando a medida que sucedeu o decreto-lei e o processo legislativo. É o Executivo avançando na competência do Legislativo, editando medidas provisórias, sem os requisitos constitucionais de relevância e urgência.
O jurista português José Joaquim Gomes Canotilho, em entrevista ao jornal Valor (4/11/2009), acredita que o Supremo Tribunal Federal esteja avançando em assuntos do Legislativo e do Executivo no que ele chama de “ativismo judicial exagerado”.Reconhece que, ao entrar nessas questões, a Suprema Corte faz alertas aos outros Poderes, com mensagens positivas e busca de soluções para os problemas brasileiros. O professor Canotilho é um dos principais constitucionalistas de Portugal (catedrático da Universidade de Coimbra) e defende que a Constituição deve ser um programa para o país. O problema é que a Constituição Brasileira de 1988 está sendo conduzida pelo Supremo Tribunal Federal e ele pergunta se é função do Judiciário resolver questões como demarcações de reservas indígenas, infidelidade de políticos aos seus partidos e uso das algemas pela polícia.
O mestre português faz referência às súmulas vinculantes, compreendendo a tentativa de dar alguma ordem, mas o problema é que elas se transformam em direitos constitucionais enquanto não são revogados pelo próprio STF.O professor Canotilho vê também um aspecto positivo no fato de o Supremo transformar julgamentos em alertas, por exemplo, se o Congresso não aprova a lei de greve dos servidores públicos, o Supremo decide por analogia que os funcionários públicos terão de cumprir as regras de greve para o setor privado.
O Legislativo igualmente, em determinadas decisões, teria invadido competência do Judiciário ao julgar parlamentares acusados de desvios éticos, ao instalar comissões parlamentares de inquérito e agir como se Poder Judiciário fosse.
O STF recentemente iniciou o julgamento sobre a omissão do Legislativo em criminalizar a homofobia.O relator de uma das ações que tratam do tema, ministro Celso de Melo, concluiu seu extenso voto (158 páginas) para reconhecer o estado de mora e omissão inconstitucional do Congresso ao não edita leis de proteção penal aos integrantes do grupo LGBTQ+. O relator propôs que até que seja editada norma sobre o tema da homofobia e a transfobia para que sejam enquadradas nos tipos penais da lei que define os crimes de racismo.É o Judiciário invadindo competência do Legislativo, data vênia.
Independência e harmonia dos poderes são indispensáveis para o fortalecimento da democracia e, consequentemente, para o país.