0l. O Governo Federal enviou ao Congresso Nacional, através do Senador Fernando Coelho Bezerra três propostas constitucionais. Uma cuida dos Fundos Públicos; outra que refaz o pacto federativo fiscal e a terceira, de que ora se cuida, busca adotar medidas permanentes e emergenciais de controle do crescimento das despesas obrigatórias.
Assim, convém que se realize um estudo sobre a composição de tais propostas para saber que, realmente, servirão para deter o crescimento da dívida pública, sana as finanças e restringe aumento de despesas.
As finanças brasileiras entraram praticamente em colapso. Houve tentativa, no governo Temer de reter despesas. Mas, a gravação feita por um empresário junto ao Presidente levou à paralisação do governo. Nada obstante, a aprovação da PEC 95 freou a ocorrência exagerada de gastos. O compromisso com a redução das despesas levou à queda de juros. A aprovação da reforma da previdência trouxe certo alívio futuro.
Agora, o Governo busca saneamento de despesas com pessoal. É a maior despesa primária dos entes federativos. As alterações propostas buscam, basicamente, o readequamento de tais despesas, permitindo às pessoas jurídicas de direito público que efetuem redução da jornada de trabalho, bem como adequação dos vencimentos.
De outro lado, busca o texto reformular os problemas de concessão e benefícios de natureza tributária. É o que se passa a analisar.
- Art. 37 da CF. A Constituição sempre entendeu os subsídios e vencimentos como irredutíveis. O texto já abria algumas exceções. Agora, poderá ser feita a redução das despesas com cargos em comissão e funções de confiança e “pela redução do valor da remuneração ou pela redução do número de cargos”, de acordo com a redação que se dá ao parágrafo 3º do art. 169, alterado na própria PEC.
A medida importará na redução temporária da jornada de trabalho (inciso I-A do art. 169) com adequação proporcional de subsídios e vencimentos que será adaptada à norma carga horária. Expedir-se-á, para tanto, ato normativo motivado de cada um dos poderes que detalhará a duração, a atividade funcional, o órgão e a unidade administrativa.
O objetivo é flexibilizar a prestação dos serviços que, ao ver do agente político, estão onerando em excesso as despesas públicas.
A solução é razoável. Com isso se retira do servidor a “soberania” que detém sobre a folha de pagamento. Ele tem que ser pago a qualquer custo, mesmo que o Estado não esteja em condições de suportar as despesas. Dir-se-á que a culpa não é do servidor, que ele é imprescindível para a regular tramitação dos serviços e encargos atribuídos à estrutura burocrática. De acordo. Só que, em dadas circunstâncias, o Estado necessita reduzir encargos para adequar-se às boas práticas fiscais. Não pode gastar mais ao que recebe. É da lógica e do bom senso.
O inciso XXIIII é acrescido ao art. 37 e por ele se veda lei ou ato que conceda ou autorize pagamento “com efeitos retroativos, de despesa com pessoal, inclusive de vantagem, auxílio, bônus, abono, verba de representação ou benefício de qualquer natureza”. A norma objetiva retirar do servidor o que tem sido feito frequentemente, ou seja, o pagamento de verbas retroativas de qualquer espécie.
O texto busca eliminar qualquer possibilidade de “imprevisibilidade” sobre a folha de pagamento. O total das despesas com os servidores deve ser conhecido quando do início do exercício fiscal. Despesa acrescida retira do ente público a possibilidade de controlar seus gastos.
- Art. 39. O § 4º do artigo é alterado possibilitando a vedação de recebimento de qualquer quantia com efeito retroativo, aplicando-se a nova redação dada ao inciso XXIII do art. 37. É comum nos Tribunais que os dirigentes determinem pagamento de subsídios por ato administrativo do colegiado. Tal hipótese fica suspensa.
A medida é salutar porque alcança o orçamento no meio de sua execução. E, como tribunais e o legislativo têm autonomia financeira, determinam o pagamento de verbas (em seu sentido mais genérico, alcançando todas as hipóteses de despesa) em atraso. Tal hipótese fica vedada.
- Art. 163. O dispositivo é alterado com acréscimo do inciso VIII que cuida de matéria de lei complementar, para que ela disponha sobre a sustentabilidade da dívida, compatibilidade com resultados fiscais e estabeleça limites para despesa e medidas de respetivo ajuste. Independe de autorização instituída pelo inciso III do art. 167. Este estabelece que é vedada “a autorização orçamentária ou a realização, no âmbito dos orçamentos fiscal e da seguridade social, de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital”.
A prática é moralizadora. Alcança as despesas em relação à dívida e respectivas operações de crédito. Não podem exceder o montante das despesas de capital. A ressalva diz respeito às autorizações legislativas “com finalidade precisa e por maioria absoluta, em turno único, na forma do regimento comum”.
Observa-se, aqui, interferência na vida legislativa, ao estabelecer um caso de maioria absoluta para aprovação das autorizações e antecipa a redação do regimento comum.
O texto legal atinge o limite de despesa com pessoal, ativo, inativo e pensionista (parte final do dispositivo).
A regra é importante para a normalização das despesas financeiras.
- Art. 164-A. Aqui continua a mutilação da Constituição. Acresce-se o artigo que busca manter a dívida pública em “níveis que assegurem sua sustentabilidade”. Em verdade, o artigo era dispensável, bastando conclamar o agente responsável para que não gaste mais do que pode. O problema é que os agentes públicos desrespeitam continuamente seus deveres funcionais. Agem com irresponsabilidade. Buscam atender ao eleitorado antes de cuidar dos excessos que não podem cometer. Agem como se tivessem administrando a vida particular. Aliás, nesta teriam mais responsabilidade, porque se não logram pagar as contas quando de seu vencimento, são lançados no rol dos maus pagadores e já se vêm impedidos de obterem empréstimos.
Na vida pública agem de forma tresloucada e irresponsável. Daí ser imprescindível que se tragam imposições duras e rigorosas no trato da coisa pública.
Todo planejamento administrativo deve guardar compatibilidade com a sustentabilidade da dívida. É o que dispõe o parágrafo único acrescido ao artigo inovador.
- Art. 167. É alterado o dispositivo para vedar operações de crédito que “excedam o montante das despesas de capital” e aprovadas pelo Legislativo. Aqui sobrevém a alteração do “turno único”.
O inciso XII é acrescido ao art. 167 para estabelecer que vedar a “criação, ampliação ou renovação de benefício ou incentivo de natureza tributária pela União” na hipótese de superar dois pontos percentuais do PIB.
A concessão de incentivos de natureza tributária é poderoso instrumento financeiro para desenvolvimento da economia de um país. Eventualmente, setores que estão paralisados por uma série de razões, devem ser incentivados para dinamizar sua intervenção e participação. Por vezes, ocorre concorrência com outros países. Então, o estímulo deve partir do governo, seja federal ou estadual, para que as empresas aumentem sua possibilidade de competir.
O desenvolvimento aumenta com os incentivos e benefícios tributários. Ao deixar de pagar um tributo, a empresa pode aumentar seus bens de capital, contratar mais pessoas, dinamizar suas vendas. Com isso, ganha o país e aumenta, de outro, lado as receitas.
Tudo isso, no entanto, deverá ser racionalizado e limitado ao percentual do PIB. O que ocorre hoje é que os governos disseminam benefícios atendendo a pressões de diversos setores.
Acrescentou-se, também, o § 6º ao art. 167. Estabelece uma reavaliação dos incentivos e benefícios concedidos a cada quatro anos. Para tanto, levar-se-ão em conta a efetividade, proporcionalidade e focalização (inciso 1º), combate às desigualdades regionais (inciso II) e publicidade do resultado das análises (inciso III).
Tais providências não eram tomadas. A concessão de benefícios e incentivos era dada sem qualquer cautela e duravam indefinidamente. Por vezes, não mais atendiam aos interesses do país. Os beneficiários continuavam a gozar de vantagens inapropriadas. Agora, a Constituição determina que se efetue revisão periódica, a cada quatro anos.
- Art. 167-A – A PEC 186 acrescenta o art. 167-A. Há um rol de proibições para que não se produzam operações de crédito indevidas ou que excedam a despesa de capital. Tão logo isso ocorra, deverão ser acionados mecanismos de estabilização e ajuste fiscal. Em consequência, ficam vedadas a todos os órgãos e poderes:
I – a concessão de qualquer vantagem, a qualquer título. O inciso é bastante inclusivo, de forma a nada deixar de fora. Não se pode pensar em qualquer benefício pecuniário. A única exceção diz respeito determinação decorrente de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal decorrente de atos anteriores ao início da vigência deste artigo.
II – criação de qualquer cargo, emprego ou função.
III – alteração da estrutura de carreira que envolva aumento de despesa.
IV – admissão ou contratação de pessoal, salvo reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa.
V – realização de concurso público, salvo para reposição de vacância.
VI – criação ou majoração de qualquer auxílio, de qualquer espécie a quem quer que seja.
VII – aumento do valor de benefícios de cunho indenizatório.
VIII – criação de despesas obrigatórias.
IX – adoção que implique reajuste da de despesa obrigatória.
X – criação ou expansão de programas e linhas de financiamento ou renegociação de dívidas.
XI – concessão ou ampliação de incentivo de natureza tributária.
Acresça-se a tais providências, as seguintes suspensões:
I – a destinação de recursos do PIS e PASEP
II - progressão e promoção funcional
III – promoção de a) juízes; b) dos membros do Ministério Público; c) serviço exterior brasileiro, d) carreiras policiais ) alterações que impliquem alterações de atribuições.
O § 2º estabelece a vedação de atos que impliquem reconhecimento de concessão ou pagamento de progressão funcional.
Decorrido o período da suspensão, restabelecem-se os direitos.
No mesmo período poderá haver redução da jornada de trabalho e redução de subsídios e vencimentos.
O § 4º considera “nulo de pleno direito ato que contrarie o disposto neste artigo”.
As disposições não constituem obrigação de pagamento futuro (inciso I), “não revogam o dispensam o cumprimento de dispositivos constitucionais e legais que disponham sobre metas fiscais ou limites máximos de despesas” (inciso II) e aplicam-se às proposições legislativas (inciso III).
- Comentários. Como o Governo considera que os gastos com servidores públicos extrapolam critérios de razoabilidade e são as maiores despesas primárias dos entes da federação, as alterações propostas são contundentes.
Num primeiro momento, há a restrição ou vedação a qualquer alteração pecuniária que possa onerar os cofres públicos. Sem exceção. Qualquer movimentação de envolva acréscimo de despesa é proibida. Não pode haver qualquer vantagem, aumento ou reajuste. Não se pode criar cargo, emprego ou função, nem alterar qualquer careira, nem realização de concurso público. É vedada qualquer aumento de despesa em relação ao funcionalismo público.
Ficam as carreiras, o ingresso e qualquer alteração funcional imobilizadas. Paralisa-se o serviço público. É como se fosse tirada uma fotografia na situação de momento. Nada se movimento. É Parmênides entrando em ação.
Ao lado das vedações, a saber, proibições de quaisquer alterações, surgem as suspensões, que atingem os membros de carreira de Estado. As proibições impedem que haja qualquer movimentação funcional que envolva aumento de despesa. Da mesma forma, as suspensões alcançam as carreiras de Estado.
Há um bloqueio total de qualquer alteração funcional. Imobilizam-se as despesas do Estado. Tudo em nome da regularização fiscal.
São providências duras, mas importantes para resguardas o montante da dívida pública. O Estado foi sangrado durante muito tempo. As tetas cheias da República esgotaram-se. Secou a disponibilidade financeira. Logo, importante que surjam medidas extraordinárias e excepcionais para fazer retornar a dívida pública a patamares aceitáveis e disciplinar o serviço público, para que não estoure o caixa público.
A norma é bastante rigorosa. Diz o § 4º do art. 167-A ser “nulo de pleno direito ato que contrarie o disposto neste artigo”. Caso não haja a anulação de ofício por parte da autoridade competente ou de superior hierárquico, caberá ao Judiciário desfazer o ato, mediante provocação da pessoa jurídica competente.
- Art. 167-B. O art. 167-A cuida dos servidores da União. O art. 167-B trata da incidência das mesmas normas restritivas aos servidores estaduais, distritais e municipais. Caso atingido o patamar de 95% a relação entre despesas correntes e receitas correntes, período de doze meses, aplicam-se as normas do art. 167-A. Isto é, podem os demais entes federativos aplicar as regras já expostas. O inciso I diz respeito aos servidores e o inciso II alcança os titulares de cargos e funções de Estado.
A apuração será realizada bimestralmente.
No caso de ente federativo necessitar de garantia da União, esta somente poderá ser dada mediante apresentação de declaração do respectivo Tribunal de Contas “que ateste a adoção das medidas previstas neste artigo” (§ 2º do art. 167-B).
O Chefe do Poder Executivo pode adotar os mecanismos previstos no caput e efetuar ajustes fiscais e o Poder Legislativo deverá aprovar ou refutar a continuidade da adoção dos mecanismos.
Cuida-se de prosseguimento das providências fiscais necessárias para estabilização financeira do Estado federal e dos demais entes federativos.
- Art. 168. O art. 168 proíbe a transferência “a fundos de recursos financeiros oriundos de repasses duodecimais”. A norma impede que, em hipótese de sobra financeira ou para fazer caixa, os órgãos dos poderes possam transferir recursos para fundos instituídos. Não que haja burla do cumprimento da lei, mas é de boa política que os recursos sejam aplicados nas finalidades de cada órgão e não sejam remanejados para aplicação em fundos.
Assim sendo, ao final do exercício, o saldo financeiro dos duodécimos devem ser devolvidos ao caixa único do Tesouro. Caso não o seja “terá seu valor deduzido das primeiras parcelas duodecimais do exercício seguinte” (parte final do parágrafo 2º do art. 168).
Na hipótese de sobra financeiro, envia-se o saldo ao caixa único. Caso o órgão deixe de cumprir a norma constitucional, o caixa único do Executivo que tem o dever de efetuar a transferência, através dos fundos de distribuição, poderá reter ou deduzir o valor não devolvido “das primeiras parcelas duodecimais” do exercício seguinte.
Não há alternativa para o Poder Judiciário, o Poder Legislativo, o Ministério Público e a Defensoria Pública. Têm que cumprir o que ora determina.
- Art. 168-A. O art. 168-A estabelece norma que evita o confronto entre os poderes. Na origem, a Lei de Responsabilidade Fiscal continha dispositivo que permitida ao Executivo limitar a despesas ou o empenho de movimentação financeira que incidiria sobre os demais poderes. A norma legal foi declara inconstitucional. Com razão, pois haveria interferência de um poder sobre o outro.
Agora, é imperativo que os poderes todos efetuem “a limitação de empenho e movimentação financeira de suas despesas discricionárias na mesma proporção da limitação aplicada ao conjunto de despesas discricionárias do Poder Executivo”. A norma alcança a todos indiscriminadamente.
Assim, nenhum poder ou os demais órgãos que gozam de autonomia financeira e orçamentária podem assumir gerência abusiva e exclusiva de seus recursos. Caso a execução das despesas não comportem o “cumprimento das metas fiscais estabelecidas na respectiva lei de diretrizes orçamentárias”, obrigatoriamente todos os entes mencionados no artigo serão compelidos a efetuar a mesma redução e na mesma proporção da limitação operada pelo Executivo.
- Art. 169. Enquanto o dispositivo anterior dispunha sobre pessoal “ativo e inativo”, o atual acrescenta os “pensionistas” como integrante das “despesas com pessoal” e que não pode exceder os limites estabelecidos em lei complementar.
Para obedecer os limites mencionados, impõe-se uma primeira providência, qual seja, a redução em pelo menos “vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança”. Era o que determinava o dispositivo. Agora pode haver a “redução do valor da remuneração” ou a “redução do número de cargos” (inciso I do parágrafo 3º).
Acresceu-se o inciso I-A (coitada da Constituição) que permite a redução temporária da jornada de trabalho com adequação proporcional dos subsídios e vencimentos à nova carga horário de, no máximo 25%. Deverá ser baixado ato normativo motivado que detalhe a duração, a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objetos da medida.
O constituinte derivado encontra formas de redução do gasto público com servidores. Como vem realçado na exposição de motivos (justificação) um dos maiores problemas com a despesa primária é o gasto com pessoal. Impõe-se, então, reduzi-lo ou adaptá-lo às circunstâncias, ainda que de temporariamente, para preservar a saúde e higidez das finanças estatais.
- Art. 198. O art. 198 se vê acrescido do parágrafo 7º que dispõe sejam levadas em consideração “as despesas com pagamento de proventos de aposentadorias e de pensões decorrentes de vínculos funcionais dos profissionais da saúde”.
A ânsia de alteração é tanta que a norma incide sobre outra do mesmo teor e constante da PEC 188. Muda apenas a redação. Naquele texto são inseridos dois incisos. Aqui, apenas o parágrafo 7º ao art. 198.
Os relatores dos dois projetos terão que se entender para que apenas um deles opine sobre o texto.
- Art. 212. Na nova redação acrescida do art. 212 ocorre coisa semelhante. A PEC 188 contém dispositivo semelhante ao que ora se altera. Acresce-se um parágrafo, o 7º ao art. 212. No outro texto que se busca inserir o conteúdo é semelhante, com previsão em dois incisos.
Os relatores de ambos os textos terão que se entender para harmonizá-los.
- Art. 111 do ADCT. Outro remendo surge com o acréscimo de parágrafo único ao art. 111 do ADCT. Dispõe que, enquanto forem aplicáveis as vedações ora instituídas, fica suspensa a correção prevista no caput.
- Art. 3º da PEC 186. Este dispositivo especifica o já contido no art. 167-A, isto é estabelece vedações no período “do segundo ao décimo terceiro mês antecedente ao da promulgação desta Emenda Constitucional, que a realização de operações de crédito, no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, excedeu o montante das despesas de capital”, serão acionados mecanismos de estabilização e ajuste fiscal.
Ao lado de tais providências, o parágrafo 1º do art. 3º contém as medidas de suspensão de direitos funcionais incidentes sobre os membros de carreira de Estado apontados nos incisos I a V da letra a do artigo em tela. As providências são as mesmas estabelecidas no art. 167-A.
Remete-se o leitor aos comentários efetuados àquele dispositivo.
Trata-se de repetição do já contido no art. 167-A.
- Art. 4º da PEC 186. Estabelece o art. 4º que, no exercício financeiro “da promulgação desta Emenda Constitucional e nos dois subsequentes, o projeto de lei orçamentária ou de crédito adicional conterá anexo com as estimativas e respectivas memórias de cálculo da redução das despesas submetidas aos limites de que trata o art. 107, em decorrência da adoção das medidas previstas nas alíneas “a” e “c” do inciso I, do parágrafo 1º do art. 3º desta Emenda Constitucional”.
O dispositivo poderia bem caber em dispositivo legal. Determina a inclusão de anexo com os resultados orçamentários por força de aplicação do art. 107. Ora, nem lei precisaria. Basta a ordem do Ministro da Economia para que tal ocorra. É mera disposição de inclusão de anexo em lei orçamentária, retratando os efeitos da aplicação de restrições fiscais implantadas.
A constituição de reserva primária a que alude o parágrafo 1º do art. 4º igualmente é matéria de norma infraconstitucional. A aplicação de tais recursos em obras públicas de infraestrutura por meio de emenda de bancada igualmente pode ser acordo obtido pelo Governo junto a seus líderes partidários.
O registro a que alude o parágrafo 2º igualmente pode figurar apenas em lei ordinária, independente de alteração constitucional. Aliás, é norma que poderia decorrer de decreto ou de portaria da autoridade competente.
- Art. 5º da PEC 186. O art. 5º aplica-se aos demais entes federativos. A estes caberá tomar providências de estabilização fiscal já comentadas. São as mesmas providências previstas no art. 167-B da PEC encaminhada ao Congresso Nacional. Os Chefes do Executivo dos respectivos entes estatais terão à sua disposição mecanismos para reduzir o déficit fiscal.
Caso não adotem medidas de redução da diferença entre despesas e receitas correntes, a União não poderá conceder aval ou garantia a ente que não se enquadre nas restrições impostas.
- Art. 6º da PEC 186. O último dispositivo estabelece a entrada em vigor imediata da PEC, ressalvado o inciso XII do art. 167 que entra em vigor em 2026. O dispositivo cuida dos benefícios e incentivos fiscais que passam a ser restringidos a 2% do PIB. A saber, o texto ainda precisa ser implementado para caber a restrição imposta.
O parágrafo único do art. 6º da PEC em comento determina a reavaliação dos benefícios e incentivos de natureza tributária, creditícia e financeira serão avaliados a cada quatro anos, levando em conta os incisos do parágrafo 6º do art. 167. A norma terá vigência imediata e alcança os já concedidos.
- Comentários finais. O conteúdo da PEC 186 busca trazer os administradores e agentes públicos para a realidade fiscal. Nenhum ente público pode gastar mais do que arrecada. Os administradores têm se descuidado de tal realidade e, buscando fazer política e não administração séria, abusam em concessão de incentivos e benefícios fiscais. Fazem-no sem qualquer cautela ou prudência. Buscam atender a reivindicações de setores da economia, não estabelecendo critérios para sua concessão. Resultado: as finanças estaduais e municipais entram em crise, ocasionando atraso nos pagamentos de credores, de funcionalismo, etc. Instaura-se a balbúrdia fiscal.
Tem em vista o descalabro em que se encontram as finanças públicas de todos os entes federativos é que se propõem as reformas apresentadas. Partindo-se de um teto e com a constatação de que os recursos são finitos, o Governo busca chamar à realidade os Chefes dos Poderes.
Apenas a reforma da previdência não basta. É importante, com certeza, mas com previsão em largo tempo. O que se busca, agora, é encontrar mecanismos de impedir a liberação de recursos mediante incentivos e subvenções de toda espécie que deverão ser reduzidas e reexaminadas, com critérios objetivos.
De outro lado, há o problema de despesa com pessoal que, segundo a exposição de motivos “é a maior despesa primária dos entes da federação” e sua magnitude “reflete, em grande medida, a prestação de serviços à população”.
Daí decorre a necessidade de se impor novos mecanismos de responsabilidade fiscal. O projeto estatui redução das vantagens funcionais de agentes públicos, com redução da jornada de trabalho e redução proporcional de vencimentos. O ato motivado que assim determinar conterá o período de incidência da norma. Em relação às profissões de Estado pode haver a suspensão de vantagens funcionais financeiras.
Assim sendo, dois são os pontos de alteração substancial propostos pela PEC 186: a) revisão dos incentivos e benefícios fiscais e b) redução de vantagens funcionais dos servidores públicos e também de agentes públicos integrantes de carreira de Estado.
A proposta ataca também as verbas da saúde e educação. Busca reduzir o enrijecimento a despesa em relação a tais áreas. Assim, ficam incluídas nos montantes destinados a tais setores o pagamento e “aposentadorias e pensões” que passam a ser consideradas para apuração “da aplicação mínima em ações e serviços públicos de saúde e na manutenção e desenvolvimento do ensino”.
De outro lado, há a exigência que fica sendo de caráter constitucional, de obrigar os poderes do Estado e efetuarem o contingenciamento de seus gastos na mesma proporção que forem fixados para o Executivo. Hoje isso não ocorre, dada a autonomia financeira de que goza cada órgão de poder.
Por fim, cuida o texto do montante da dívida pública que deve ser mantida em patamares adequados e sustentáveis, estabelecendo medidas a serem adotadas, na hipótese de fugir do controle.
Em verdade, assiste-se ao descontrole total das contas públicas. Gasta-se mais do que se recebe, concedem-se incentivos sem qualquer critério, não restrição a verbas com servidores públicos, aumenta-se indiscriminadamente a dívida pública.
Nenhum país subsiste a desmandos reiterados e contornáveis, em curto e longo prazo.
Assim, as medidas se impõem, cabendo ao Congresso Nacional efetuar estudos necessários para alterar, adaptar e corrigir eventuais excessos e reduzir possíveis fragilidades.
É o que penso.
* REGIS FERNANDES DE OLIVEIRA - PROFESSOR TITULAR APOSENTADO DE DIREITO FINANCEIRO DA USP