(Folha de S.Paulo)
A Lei nº 13.254/16, que permite, na linha adotada pela maioria dos países desenvolvidos, a legalização de recursos mantidos no exterior - não decorrentes de corrupção, narcotráfico ou terrorismo - é plenamente justificável, apesar de mal redigida e pior esclarecida em instruções normativas.
É difícil compreender a crítica que se tem feito a essa possibilidade de regularizar patrimônio no exterior. Em artigo que escrevi para esta Folha, há um ano, sobre a má qualidade do texto legislativo e a canhestra solução punitiva, argumentei que um projeto dessa natureza era necessário.
À época, Everardo Maciel, Luiz Schoueri, Rogério Gandra Martins e eu mesmo defendíamos um projeto de extinção de qualquer punibilidade, desde que se pagasse o imposto de renda com multa moratória, no mesmo padrão permitido a qualquer contribuinte brasileiro em atraso.
O acréscimo no montante a ser arrecadado seria em torno de 3%. Ninguém poderia contestar. Criou-se, todavia, uma redução do Imposto de Renda e uma multa sem natureza definida, que tem gerado críticas.
A principal delas é que não seria justo beneficiar sonegadores. É feito principalmente por servidores dos três Poderes, que continuam obtendo benesses e aumentos de vencimentos enquanto os cidadãos não governamentais amargam um desemprego de 11 milhões de pessoas.
Por isso, os 36% de carga tributária em relação ao PIB são insuficientes para sustentar a classe de servidores – lembrando que, por levantamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 2012, nossa carga era superior a dos Estados Unidos e Coréia (24%), Japão e Suíça (29 e 28%) e China e México (abaixo de 24%).
O Brasil é formado por cidadãos de primeira e segunda categoria. De um lado, os que têm segurança absoluta no emprego e podem usufruir de benesses, mordomias e aposentadorias especiais; de outro, aqueles sem maior segurança para o futuro.
Por outro lado, grande parte dos recursos foi enviada ao exterior para assegurar o patrimônio em tempo de instabilidade política. À maneira do que ocorrer em outros países, estimula-se agora o retorno, o que pode gerar receitas públicas e recursos para combater a crise.
Aqueles que contestam sua concessão de benefícios teriam que contestar todas as anistias e remissões liberadas sistematicamente adotadas no país nos últimos 50 anos por todas as entidades federativas.
A indecente carga tributária brasileira obriga os governos, de tempos em tempos, a decretarem tais anistias e remissões. Isso irriga as combalidas burras oficiais, dirigidas por uma burocracia esclerosada, e permite que o país sobreviva economicamente.
A lei de repatriação é, portanto, mais uma concessão, nos moldes das que já presenciei, continuamente, nestes 59 anos de advocacia.
Apesar de a lei ser mal elaborada e confusa, considero que os contribuintes enquadrados nas hipóteses de repatriação, devem acatar a proposta governamental, pois, a partir de 2018, segundo acordo internacional, não haverá mais sigilo possível, no sistema financeiro mundial, razão que levou, em outros países, à adesão às repatriações, com base em leis muito mais claras e adequadas.
Espero, todavia, que o governo melhore a qualidade da legislação e aumente a potencialidade da receita, determinando que apenas o patrimônio existente no dia 31/12/2014 seja objeto de imposto e multa.