“Ativismo Judicial” precisa ser explicado dizem juristas sobre defesa de Moraes
(Jornal O Globo)
BRASÍLIA — Em uma longa sabatina, que se estendeu da manhã à noite de terça-feira, o ministro licenciado da Justiça e indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, minimizou a atuação que terá na Lava-Jato na Corte e criticou o chamado ativismo judicial, afirmando que o Judiciário não pode substituir o Legislativo. Disse não dever “favor político” pela indicação e avisou que não se julgará impedido de atuar em processos envolvendo a gestão do presidente Michel Temer.
A crítica ao „ativismo judicial‟ foi um aceno aos senadores diante das recorrentes queixas de que o Judiciário estaria “legislando” indevidamente. Moraes alertou que, se a atuação do STF for muito acentuada, surge um embate com o Congresso, que pode gerar uma “guerrilha institucional” sem ninguém para arbitrar o conflito entre poderes. A primeira reação surgiu ontem mesmo, com o decano do Supremo, Celso de Mello, discordando do provável futuro colega.
Preparado para responder a questões sobre o fato de ter ocupado o Ministério da Justiça, destacou que desde a década de 1940 chegaria a 45% o percentual dos ministros do Supremo que teriam como origem o Executivo ou o Legislativo. Ele prometeu atuar com imparcialidade e independência no cargo.
Rubens Glezer
Apesar de alguns senadores terem achado reconfortante as falas sobre o ativismo, elas foram absurdamente genéricas. Em termos concretos, é impossível saber como ele vai se portar. O que ele conseguiu ali foi não se prender a nenhum tipo de compromisso. Isso é conveniente para o que será o perfil dele. Alguém que não se sente constrangido por nenhum tipo de processo ou opção jurídica, se sentindo muito livre para agir com base em suas convicções. As questões de base não foram bem respondidas na sabatina. Isso acabou frustrando o sentido muito importante da sabatina que é exatamente saber as condições mínimas da pessoa que está sendo indicada, de que tipo de atividade que ela vai fazer até os 75 anos de idade. Boicota o sentido da sabatina. Ele não deu nenhum caso concreto. Foi como dizer que é a favor da liberdade de expressão e ser contra abusos. Para mim, o Alexandre de Moraes que vai para o STF é o político. Rubens Glezer é professor da FGV-SP
Marcelo Figueiredo
A posição dele sobre ativismo judicial precisa de mais detalhamento. O Brasil copiou esse modelo de sabatina dos Estados Unidos, mas não copiamos a tradição de escrutínio que há lá. O correto seria pegar casos bem difíceis onde houve uma tensão entre o Congresso e o Supremo e perguntar: como você julgaria? Não tem como não responder. Isso seria uma pergunta realmente procedente. Eu acredito que ele vai ser mais intervencionista no Legislativo, mas deve privilegiar uma visão mais formalista da lei escrita. A maioria dos ministros é ativista no dia a dia do Legislativo. Faltou uma pergunta sobre o caixa dois, sua opinião sobre a constitucionalidade de uma anistia ao caixa dois, se é crime ou não. É uma questão problemática hoje, mas a sabatina, da forma como é feita, não consegue avaliar. Há um jogo de cena e ninguém responde nada, não fazem perguntas contundentes porque não querem ficar mal com ele. Os senadores falharam em fazer questões mais pontuais. Marcelo Figueiredo é professor da PUC-SP
Dircêo Ramos
A escolha pelo Alexandre de Moraes foi polêmica. Acho que será assim no Supremo, com decisões polêmicas. Ele gosta um pouco de aparecer e isso pode comprometer sua atuação como ministro quando ocupar o cargo. Houve, por exemplo, o caso da entrevista em que ele antecipou uma operação da Lava-Jato. O que ele deve fazer agora é esquecer tudo isso e ter um comportamento neutro, isento e sobretudo não se comprometer em processos. Há sobre ele uma incógnita pela participação que teve como político. Deve tentar evitar esse tipo de comportamento, a maneira de se manifestar, se antecipar. Vai julgar muitos senadores que o estão sabatinando. Será que ele vai se declarar suspeito? Muitos são ligados ao governo Temer ou que trabalharam com ele no Ministério. Ele se manifestou também sobre a questão do plágio, que é importante. Ele me cita na obra dele e põe lá a minha obra, de forma acertada. Talvez, na pressa, podem ter se descuidado. Dircêo Ramos é livre-docente da USP
Luciano Godoy
Conheço o Alexandre há muitos anos. Mas fico um pouco decepcionado com o Senado porque poderia ir mais a fundo na sabatina, ela poderia ser mais incisiva em temas polêmicos. Aborto, drogas, violência, movimentos sociais, assuntos que vão depois passar pelo Supremo. Eu não acho o ativismo judicial ruim em si, faz parte da república brasileira. A gente vive um momento de gigantismo do Judiciário. O Judiciário está muito presente na vida das pessoas, mas acho que ele tem um perfil menos intervencionista. Tem uma história de vida de um perfil liberal. Mesmo sendo oriundo do governo, a estabilidade e a garantia de um cargo vitalício dão muita independência para o ministro do Supremo. Eu acho que virá mantendo a mesma tônica do Supremo que havia com o ministro Teori. Sou um otimista na Lava-Jato, que tem papel importante no combate à corrupção. Sou bem otimista com a nomeação dele, vai manter a mesma toada. Luciano Godoy é professor da FGV-SP