O cumprimento da pena de prisão após condenação em segunda instância é objeto de discussão desde os néscios até os mais conceituados conhecedores do direito. É o que verificamos através de comentários dos renomados juristas e das divergências no próprio Supremo Tribunal Federal. O Hermeneuta ao fazer a exegese dos textos, constitucional e infraconstitucional, deve adotar as técnicas de interpretação: gramatical, histórica, lógico-sistemática e teleológica. Assim evitar-se-á fatiamentos entre inocência e culpa, a dúvida quanto ao uso de preposições, a exemplo de “com” inabilitação, por oito anos (artigo 52, parágrafo único da Constituição federal), a conjunção coordenada aditiva adicionará e não dividirá, as palavras terão o seu sentido exato em suas vicissitudes semânticas no tempo e no espaço, bem como na atualidade semantema. Historicamente, além do retrospecto no tempo e no espaço, nos traz a discussão dos institutos na elaboração pelos interpretes autênticos, os competentes do Poder Legislativo. A análise lógico-sistemática permite a interpretação considerando vários dispositivos, mas deve-se utilizar todos os relacionados a cada caso e não apenas aqueles que interessam para uma decisão ou conclusão subjetiva. A técnica teleológica conduz à finalidade dos dispositivos normativos. Outra questão polêmica é a interpretação conforme a Constituição. Qual Lei Magna se cada interprete tem a sua, de acordo com sua formação, sua cultura, sua verdade ou outros fatores influenciadores? O Supremo Tribunal Federal é o guardião do Texto Maior, mas ele o interpreta e não o faz, todavia, em alguns casos, em decisão monocrática, das turmas ou de onze ministros, interpreta cada um a sua Lei Superior e não a do Poder Constituinte Originário – Congresso Constituinte, composto de 513 deputados, representantes do povo, mais 81 senadores representantes dos estados-membros, num total de 594 parlamentares. Isto ocorre quando há excesso de ativismo, invadindo tanto as competências do legislador ordinário, quanto do Constituinte.
O “trânsito em julgado” ocorre quando forem esgotadas todas as possibilidades de recursos judiciais. Inocência significa falta de culpa, inculpabilidade. Culpa é a responsabilidade por ação ou por omissão prejudicial, reprovável ou criminosa, delito, crime.
O artigo 5º, em seu inciso LVII diz:
“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”
Ora, se há possibilidade de recursos à 3ª STJ e à 4ª STF, instâncias, não foram esgotadas, portanto não transitou em julgado. Embora não se aprecie provas, mérito e sejam poucos os casos revistos, devido à eficiente atuação jurisdicional de 1ª e 2ª instância, poderá prejudicar inocentes. Eventualmente, haverá absolvição ou redução da pena que influenciará na dosimetria com conseqüências no regime de cumprimento: fechado, semiaberto ou aberto. Por essas razões, a finalidade é não considerar culpado, criminoso, delinqüente, enquanto não se esgotarem os recursos, ou seja, transitar em julgado. Se não é criminoso, não é culpado, ainda, não deverá iniciar o cumprimento da pena, ir à prisão após condenação em 2ª instância. Sofrerá um dano irreparável se absolvido ou iniciar o cumprimento em regime mais severo.
O inciso LXI, do artigo 5º, CF, diz:
“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar definidos em lei”
Este mandamento é utilizado como determinante da prisão ao contrário do inciso LVII, do artigo 5º. É certo e no caso presente, como em todos os demais a prisão requer ordem escrita e fundamentada da autoridade competente. O preceito foi obedecido em 1ª e 2ª instância. Foi determinada a culpa que afasta a inocência. No entanto, deve-se respeitar o inciso LVII ao prever ausência de culpa enquanto houver recurso, ou se não transitou em julgado e há a presunção de inocência. Por isso presunção “júris tantum”, até prova em contrário. Cabe ao hermeneuta decidir tratar-se de efeito suspensivo ou interpretação sistemática e optar considerando o princípio “in dubio pro reo”. Neste sentido temos ainda vários dispositivos constitucionais. O inciso LXV, diz:
LXV – “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela
autoridade judiciária”
LXVI – “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando
a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”
LV – “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”
Do exposto depreende-se ser uma prisão inconstitucional e ilegal de acordo com o CPP; se não estão presentes as condições para a prisão preventiva, a lei admite a liberdade provisória; não se esgotou o contraditório, a ampla defesa e os recursos e, portanto, ainda mais, o devido processo legal (inciso LIV) impedindo a privação da liberdade.
A Lei Maior é feita para limitar poderes e organizar o Estado. Ela protege os cidadãos e com esse objetivo acaba beneficiando os grandes delinquentes, praticantes de imensuráveis crimes e em enorme quantidade. A possibilidade de recursos conduz a infindáveis processos, às prescrições e a estas favoráveis com redução após os 70 anos de idade, tudo levando à sensação de impunidade. Muitos afirmam, ser um retrocesso do Poder Judiciário, mas na realidade é um retrocesso da Constituição “cidadã” que oferece essas permissões.
O povo não suporta mais. A vontade popular, embora, hoje, seja diferente do amanhã, está prisioneira do Texto Maior, neste bloco de cláusulas pétreas inabolíveis por Emendas do Poder Constituinte Derivado. A solução será uma nova Constituição definindo o trânsito em julgado na 2ª instância, sem mais recursos, reafirmando o duplo grau de jurisdição ou admitir por Emenda essa definição, já que a Constituição diz trânsito em julgado, mas não determina o momento da ocorrência deste e no aspecto material, quanto ao mérito e provas, esgotaram-se os recursos devido à não apreciação pelo STJ e pelo STF e não haver efeito suspensivo, embora no aspecto formal poderá surgir questão de direito alterando a pena com conseqüências no sistema de cumprimento. Não se trata de abolir ou restringir cláusula pétrea, mas de esclarecê-la; através de um parágrafo, apresentado na Emenda aditiva.