Fonte: Estadão 7/9/2021 - Blogs Fausto Macedo

Os brasileiros querem e precisam de paz! Que não seja a dos cemitérios! Uma paz fruto de respeito mínimo pela diversidade exuberante entre as pessoas e suas linhas de pensamento.

O Brasil quer paz!

Os brasileiros querem e precisam de paz! Que não seja a dos cemitérios! Uma paz fruto de respeito mínimo pela diversidade exuberante entre as pessoas e suas linhas de pensamento. Umajose r nalini a4277 nação que se pretende venha a ser uma Pátria justa, fraterna e solidária, não pode ceder à alucinação de um território dividido entre os que fanatizam extremidades igualmente nocivas.

“In médio virtus”, ensinava o estagirita. Postar-se num dos polos é um excesso indesejável. A virtude é o equilíbrio, o meio-termo, a sensatez. Tudo aquilo que parece faltar em razoável parcela do pensamento nacional.

É o momento propício para que as pessoas com um resíduo de lucidez se preocupem com o futuro da humanidade, a começar por sua prole e as que dela derivarão. Não é padrão de sapiência comportar-se da maneira como têm se portado algumas figuras, até bizarras, na conclamação para condutas impróprias a um ser racional, que se pretenda civilizado.

Oportunidade para rever lições clássicas de pensadores hoje olvidados, como Nicolas Malebranche, tão atual ao considerar que “mesmo os sábios e aqueles que se orgulham de sua inteligência passam mais da metade de sua vida em ações puramente animais, ou em ações tais que dão a pensar que se preocupam mais com sua saúde, seus bens e sua reputação do que com a perfeição de seu espírito. Estudam mais para adquirir uma grandeza quimérica na imaginação dos outros homens, do que para dar a seu espírito ais força e maior extensão; fazem de sua cabeça uma espécie de guarda-móveis, no qual amontoam, sem discernimento e sem ordem, tudo o que carrega certo caráter de erudição, quero dizer, tudo o que pode parecer raro e extraordinário e excitar a admiração dos outros homens. Vangloriam-se de se assemelhar a esses armazéns de curiosidades e antiguidades que não têm nada de rico, nem de sólido e cujo preço não depende senão da fantasia, da paixão e do acaso; não trabalham quase nunca para tornar seu espírito justo e dar regras aos movimentos de seu coração”.

Essa a senda observada por aqueles que pretendem construir muralhas ideológicas entre distintas maneiras de enxergar como deva ser o convívio e qual o papel do Estado na coordenação da vida comum. O Estado é um instrumento preordenado a permitir que, em seu interior – garantido pela mais segura ordenação da vontade comum – se desenvolvam as potencialidades visadas pelos indivíduos e pelas sociedades particulares.

Um Estado não pode existir para impor uma diretriz ao pensamento coletivo. Ele é o observador das diferenças, o garantidor de que todas as expressões do pensamento possam ser livremente expostas, para que cada qual adote aquela que melhor convier à sua visão de mundo. E que todos possam, em qualquer momento, mudar de opinião. Pois a rigidez é própria ao momento inicial do cadáver. Logo em seguida, ele entra em putrefação.

A comunhão nacional não precisa de conflitos, de arruaças, de ameaças e de provocações. Nem de injúrias, ofensas, calúnias e difamações. Precisa da união de todos para perseguir o verdadeiro adversário do desenvolvimento integral: a educação ética, a cultura, a busca incessante do conhecimento e a urgência de se impregnar de tudo o que a ciência e a tecnologia colocam à disposição do gênero humano, para aprimorar a convivência.

Essa a verdadeira vocação dos brasileiros no momento histórico em que a pandemia escancarou e exibiu, despudoradamente, a miséria mais abjeta de milhões de semelhantes. A exclusão, a falta de educação de qualidade, de saúde integral, principalmente na prevenção de males perfeitamente controláveis, de infra-estrutura, de saneamento, de uma consciência ecológica suficiente a impedir a devastação de nosso maior patrimônio: a floresta, a água doce, a biodiversidade e o potencial inexplorado de nossas riquezas.

A via a ser perseguida é a de união de esforços na comunhão de ideais perfeitamente factíveis: a vivência fraterna entre seres humanos desiguais, mas todos providos daquele signo identificador da criatura racional: a prerrogativa da dignidade. Princípio norteador do pacto fundante ao qual todos devemos observância estrita. Na leitura que dele extraia a paz entre os vivos, não a paz perpétua das necrópoles.

“A grande Via não tem porta. Milhares de estradas desembocam nela”. Todas as opções pacíficas são válidas “Cada coisa caminha a todo tempo com seu contrário”. Quem não entender essa verdade singela pode ingressar num desvio perigoso, conducente à luta fratricida, ignomínia para a qual os brasileiros de bem não estão preparados. Nem querem estar a sê-lo, em qualquer outro momento. O Brasil merece mais. Nossos filhos e netos também. A História nos julgará por aquilo que fizemos ou deixamos fazer neste mais do que angustiante Dia da Pátria de 2021.