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O título acima deve ser interpretado com certa elasticidade, porquanto os comentários que expendo neste artigo são aplicáveis a toda a América de fala espanhola, e até mesmo ao Brasil. Afinal, segundo a lição de José Pedro Galvão de Sousa, Portugal e todos os países lusófonos integram o Universo Hispânico...

É impossível estudar a História da América Latina sem fazer menção àqueles homens conhecidos como “Os Libertadores das Américas.” Atuaram no século XIX, e romperam os laços políticos do continente com a “Madre España.” Muitos foram os “libertadores”, e ora me limito a enunciar os nomes de três deles, Simón Bolivar, José de San Martin e Bernardo O’Higgins.

Em comum, os “libertadores” ostentavam a ideologia do Liberalismo Político e Econômico, sendo ademais disto, em sua generalidade ao menos, filiados à Franco-Maçonaria. O modelo político que os “libertadores” tinham em mente eram os Estados Unidos da América, havia pouco saídos da sua “Guerra de Independência.” E, com a sinceridade de jovens idealistas, procuraram eles ser fiéis ao modelo político norte-americano.

A imitação a que me refiro foi desastrosa para toda a América Espanhola. Com efeito, como demonstro em meu livro “Horizontes Da História E Do Direito – Estudos Em Memória Do Professor Miguel Reale”, o fenômeno da “rejeição” não existe apenas na Medicina: ele está presente, também, no campo das instituições políticas e jurídicas... e, nesta ordem de ideias, a República Presidencialista, que foi e é bem sucedida nos Estados Unidos da América, não aprovou satisfatoriamente em nenhum país da América Latina... aqui, o Presidencialismo degenerou e degenera no Caudilhismo.

A rigor, os “Libertadores das Américas” deveriam ser chamados de “Fragmentadores das Américas”, porquanto eles destruíram a soberba unidade política do Império Espanhol no Novo Mundo!... o Brasil escapou de ser fragmentado, graças unicamente à instituição monárquica, à qual deve, até hoje, a sua invejável unidade política.

Um homem houve, entre os “libertadores” que teve a lucidez suficiente para perceber que a separação da América da Coroa Espanhola tinha sido um erro. Este mesmo homem teve a dignidade e a honestidade suficientes para confessar tudo isto. Ele se chamava Simón Bolivar. O livro “Simón Bolívar: Escritos Politicos” publicado em Madrid por “Alianza Editorial S.A.”, contém a carta escrita por Bolívar, em Novembro de 1830, ao General Juan José Flores, um venezuelano que seria o primeiro Presidente do Equador. Para que o pensamento do autor fique bem vívido, deixarei os excertos da “Carta de Barranquilha” no original castelhano: “Mi querido general: Vd. sabe que yo he mandado veinte años, y de ellos no he sacado más que pocos resultados ciertos: 1.º, la América es ingovernable para nosotros; 2.º, el que sirve una revolución ara en el mar; 3.º, la única cosa que se puede hacer en América es emigrar; 4.º, este país caerá infaliblemente en manos de la multitud desenfrenada para después pasar a tiranuelos casi imperceptibles de todos colores y razas; 5.º, devorados por todos los crímenes y extinguidos por la ferocidad, los europeos no se dignarán conquistarnos; 6.º si fuera posible que una parte del mundo volviera al caos primitivo, éste sería el último período de la América.”

Como vemos, Simón Bolívar, homem inteligente, culto e intelectualmente honesto, foi profético quanto ao futuro de toda a América Latina... aqui o Brasil pode e deve ser incluído na antevisão do ilustre venezuelano. E todos os males antevistos por Bolívar decorrem da absoluta inadequação das instituições políticas e jurídicas adotadas a partir do século XIX à realidade deste continente... o fenômeno da “rejeição”, enfatizo, transcende o campo da Medicina, para adentrar o do Direito. E neste sentido, Savigny e a Escola Histórica andavam com acerto: As instituições de um povo derivam das vicissitudes históricas pelas quais passa este povo!...

*Acacio Vaz de Lima Filho, Livre-Docente em Direito Civil, área de História do Direito pelo Largo de São Francisco, é acadêmico perpétuo da Academia Paulista de Letras Jurídicas, titular da Cadeira de nº 60. Patrono: Luiz Antonio da Gama e Silva