Titular da Cadeira 70 da Academia Paulista de Letras Jurídicas, patrono Thomas Marky.
Homero Batista Mateus da Silva, Juiz titular da 88ª Vara do Trabalho de São Paulo e Professor da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (Universidade de São Paulo).
Resumo: o presente artigo, compilado a partir de estudos feitos pelo autor em livro de Processo do Trabalho1, objetiva lançar luzes sobre princípios e singularidades que envolvem os Recursos Extraordinários, destinados ao controle difuso de constitucionalidade no âmbito do Supremo Tribunal Federal, provenientes da Justiça do Trabalho. Conquanto seja correto afirmar que o Recurso Extraordinário deita raízes na Lei Maior e encontre regulamentação no acervo conceitual do Processo Civil, temos de admitir que o Processo do Trabalho impõe alguns aspectos complementares sensíveis. Cita-se como exemplo a necessidade de convivência e de coerência entre o Recurso Extraordinário e o recurso de Embargos de Divergência, a partir do quê se conclui que o acesso ao Supremo pode ser feito diretamente do acórdão turmário ou do acórdão da Seção Especialiada do Tribunal Superior do Trabalho. O impacto da Reclamação Constitucional também é lembrado neste estudo.
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Panorama do Recurso Extraordinário de âmbito trabalhista
O Recurso Extraordinário, principal via de acesso ao Supremo Tribunal Federal, é estudado no âmbito do Direito Constitucional e Direito Processual Civil.
Raramente se debruça sobre ele no Processo do Trabalho, por não se considerar parte integrante do sistema recursal especializado.
Não se deve perder de vista, todavia, que ele possui assento na Consolidação das Leis do Trabalho e que, aos poucos, assumiu o papel pivotante para a disciplina das relações trabalhistas, dada a constitucionalização de numerosos direitos e institutos laborais, especialmente na Lei Maior de 1988.
O Recurso Extraordinário aparece na legislação trabalhista apenas para dizer que a sua tramitação não impede a execução da sentença, tendo se consagrado a interpretação de cunho meramente gramatical, indicando-se o efeito meramente devolutivo do Recurso Extraordinário.
A execução provisória impera, portanto, sempre que houver a pendência do apelo máximo, em tramitação perante o Supremo Tribunal Federal, ainda que fadado ao fracasso ou com escassas chances de êxito.
A segunda vez em que o Recurso Extraordinário é referido pela Consolidação das Leis do Trabalho se relaciona com o procedimento de escolha de processo representativo da controvérsia, para encaminhamento ao Supremo Tribunal Federal, e suspensão de tramitação dos processos análogos, que ficam represados na origem.
De maneira geral, podemos chamar esse mecanismo de instauração de uma controvérsia, procedimento análogo àquele adotado em diversas modalidades de incidente de uniformização de jurisprudência e de julgamento de Recurso de Revista repetitivo.
A diferença reside apenas no fato de que, nesse particular, trata-se da autoridade hierarquicamente inferior, que submete a controvérsia para autoridade superior, representada pela Corte Constitucional, indagando sobre a pertinência de o julgamento do caso representativo, se assim entender o tribunal de destino, por ter ser aplicado para os casos semelhantes.
Foi assim que, aos poucos, o Processo do Trabalho teve de estabelecer convivência harmônica com um recurso estranho aos seus cânones, julgado por Tribunal fora da sua organização judiciária, mas que, nada obstante, possui prioridade lógica e hierárquica.
O prazo do Recurso Extraordinário é de 15 dias, afastando-se do padrão trabalhista de oito dias, por se tratar de norma especial.
O recolhimento de depósito recursal foi dispensado a partir da década de 2020, por ser considerado incompatível com a jurisdição constitucional.
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Competências recursais do Supremo Tribunal Federal e o filtro da repercussão geral
O modelo híbrido, adotado pelo ordenamento brasileiro, que concentra na mesma unidade judiciária atividade interpretativa da Constituição pelos mecanismos concentrados e pelos mecanismos difusos, gera inevitavelmente as tensões e o descompasso da mescla de apelações com as decisões originárias.
A partir da década de 2000, com grande ênfase ao final da década de 2010, assumiu definitivamente a necessidade de aplicação de um filtro de admissibilidade do Recurso Extraordinário, capaz de conciliar a recorribilidade das partes com a natureza excepcional do acesso às Cortes constitucionais.
A este filtro, de complexa aprendizagem e maturação, chamamos de mecanismo da repercussão geral.
Não se trata de novidade na literatura jurídica, mas a experiência revela ser mais condizente com os países de tradição anglo-saxã, marcado pelas tintas fortes do direito consuetudinário.
Não é impossível adotar o sistema de repercussão geral no ordenamento de tradição romana, com direito codificado e com a primazia da legislação positivada, mas esse ajuste não é feito sem contradições do sistema e sem as tensões inerentes ao critério de seleção entre o que pode e o que não pode ser apreciado pela corte constitucional.
Reforça ainda mais a complexidade da importação do sistema o fato de que, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, não se adota o julgamento por consenso, praticado em outras experiências jurídicas, nem fica claro onde reside precisamente a razão de decidir: dado que o relator redige seu voto e pode ser contestado o complementado por todos os seus pares, não raro o jurisdicionado se depara com situação de alta complexidade para a compreensão do dispositivo do acórdão, e, ainda mais, da tese adotada.
Com efeito, a sistemática da repercussão geral pressupõe a elaboração de uma tese sintética, reveladora dos debates que foram travados, o que a aproxima, por assim dizer, de uma espécie de súmula, tal como o sistema brasileiro está acostumado.
Dado que as partes não poderão nem sequer agravar da decisão para confirmar a pertinência do arrastamento no próprio Supremo Tribunal Federal, criou-se uma situação de elevada responsabilidade para quem exercer o juízo de admissibilidade na origem.
De fato, a sistemática da repercussão geral pressupõe que, uma vez sedimentado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, contra ou a favor da carga constitucional de determinado assunto, nenhum outro processo, idêntico ou análogo, poderá retornar para aquela casa: se o julgamento estiver em consonância com a decisão, o Recurso Extraordinário é barrado e o processo deve ser devolvido para a primeira instância; se o julgamento do órgão fracionário de origem estiver em divergência com a decisão de repercussão geral, o Recurso Extraordinário é devolvido para o prolator da decisão, que está obrigado a exercer o juízo de conformidade, também chamado de juízo de retratação por alguns autores.
Importa observar que a atribuição dos efeitos de ausência de repercussão geral pode ser verificada tanto em hipóteses de matéria meramente infraconstitucional, sem vocação para os recursos de natureza extraordinária, quanto, também, em hipóteses de matérias constitucionais sem a devida densidade ou dimensão.
Esse conceito de matéria constitucional restrita ou limitada é relativamente novo em nosso ordenamento, tendo o propósito de permitir que o Supremo Tribunal Federal se atenha às causas de alcance fora dos interesses subjetivos.
Não é correto dizer que o Supremo poderá “escolher” as matérias que queira julgar, como normalmente se refere ao desempenho da Suprema Corte americana, mas sabemos que essa dúvida deve perseguir a mente do jurisdicionado quando, aos poucos, estiver mais desenvolvido o acervo conceitual dos casos cuja repercussão geral foi acolhida e dos casos em que se considerou não excedido o limite subjetivo das partes.
Para fins de melhor comunicação, proponho o uso da expressão repercussão geral negativa, para as hipóteses infraconstitucionais e para as hipóteses de baixa densidade.
Contra a decisão que exercer juízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário, dentro da modalidade da repercussão geral, resta para o advogado unicamente manejar o Agravo Interno, para que o órgão colegiado aprecie a pertinência da admissibilidade, dentro do próprio Tribunal Superior do Trabalho, ou seja, dentro da própria origem, sem que o Supremo Tribunal Federal, como já dito, volte a emitir qualquer opinião a respeito.
A inserção do tema em repertório de repercussão geral, portanto, tem o condão de sedimentar o conteúdo da interpretação e de barar, a um só tempo, tanto Recurso Extraordinário quanto o próprio agravo para destrancar o Recurso Extraordinário, que passará a ser apreciado horizontalmente na corte de origem, com a única diferença de que o juízo de admissibilidade monocrático poderá ser revisto por juízo de admissibilidade colegiado, mas sem sair do juízo de origem.
Se porventura a matéria não se incluir no repertório de repercussão geral, nem com a carga positiva de constitucionalidade nem com a declaração negativa de constitucionalidade, então estaremos diante de um assunto novo, que pode eventualmente despertar interesse do Supremo Tribunal Federal para a apreciação do tema em sede de Recurso Extraordinário.
Em verdade, essa é a única brecha que sobra para o advogado contemporâneo tentar o acesso para a corte constitucional, a que chamaremos de juízo clássico de admissibilidade, para diferenciar do acima descrito juízo de admissibilidade em sistema de repercussão geral.
Isso não significa que o juízo clássico será fácil: o advogado terá que preencher todos os pressupostos extrínsecos, já conhecidos do sistema recursal brasileiro, e procurar sensibilizar o órgão julgador quanto aos pressupostos intrínsecos, os quais incluem a alegação de violação direta aos comandos constitucionais bem como o delineamento de uma preliminar de repercussão geral, vale dizer, de uma demonstração de que a matéria realmente transborda os limites daquele processado e tem o potencial de afetar aspectos sociais, jurídicos, econômicos e políticos espalhados pelo ordenamento.
Nesse caso, se o Recurso Extraordinário for barrado na origem na modalidade de juízo clássico de admissibilidade, a decisão desafia o Agravo de Instrumento para o Supremo Tribunal Federal, e não para órgão colegiado da origem, porque será a primeira vez que a matéria chegará a Corte Constitucional.
O Supremo Tribunal Federal pode indeferir liminarmente um agravo de instrumento neste caso, se não se convencer da preliminar de repercussão geral, se não se convencer da alegação de violação direta a norma constitucional ou, ainda, se entender que a matéria, em verdade, estava embebida em algum tema de repercussão geral adrede concebido, dentro daquilo que nós chamamos acima de analogia ou arrastamento.
Dado que a Presidência do Supremo Tribunal Federal pode fazer essa filtragem preliminar, entendemos que o Recurso Extraordinário é o único caso com cinco momentos diferentes de juízo de admissibilidade: os demais recursos sofrem a filtragem pelo juízo de origem, pelo relator, pelo revisor e pelo órgão fracionário, ao passo que o Recurso Extraordinário também pode passar pela peneira da Presidência da corte constitucional, antes mesmo de ser distribuído para o Relator.
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Juízo de retratação em Recurso Extraordinário em regime de Repercussão Geral
Uma vez sedimentada a tese pela Corte Constitucional em regime de Repercussão Geral, várias consequências são deflagradas.
Se havia sido instaurada uma controvérsia pelo Tribunal Superior do Trabalho, vale dizer, se haviam sido enviados apenas os processos representativos da controvérsia e suspensa a tramitação dos demais, a decisão deverá ser replicada em todos eles.
Para aqueles acórdãos que estavam em consonância com a tese superveniente, certifica-se o trânsito em julgado, com a baixa dos autos à origem.
Para os julgados que estavam em dissonância com a tese sufragada pelo Supremo, impõe-se o exercício do juízo de retratação, a que preferimos chamar de juízo de conformidade ou de conformação, dado que o julgado era hígido, mas apenas necessita ser adaptado ao quanto decidido pela instância máxima.
Há quem sustente a violação, pelo juízo de conformidade, à liberdade de convicção do magistrado, mas, neste passo, é suficiente notar que o órgão prolator da decisão será apenas a longa mão do Supremo, ultimando o julgamento que começou no âmbito da Corte Constitucional e, pela lógica do sistema, será concluído pela pena do órgão hierarquicamente inferior. A imagem da longa mão do Supremo diz muito sobre essa espécie de obrigação de prolação de julgado mediante parâmetros adrede fixados, além do que ajuda a entender por que não haverá novo recurso para a parte que houver sucumbido dentro da retratação – em verdade, ela já sucumbira no dia em que o Supremo prolatou a decisão vinculante aos demais processos sujeitos àquele regime.
O juízo de retratação é exercício pelo órgão fracionário prolator da decisão, como a Turma ou a Seção Especializada em Dissídios Individuais.
Entendemos recomendável franquear a palavra ao advogado em sustentação oral em sessão de deliberação sobre o juízo de conformidade, haja vista a possibilidade de serem realçados tópicos de distinção fática ou jurídica sobre o tema. Afinal, o juízo parece ato mecânico, mas oferece numerosas variáveis e nuances nem sempre reveladas em primeira leitura.
Dito isso, não aderimos ao entendimento de que a parte possa interpor, na sequência, novo Recurso Extraordinário da decisão final do Tribunal Superior do Trabalho: independentemente da sucumbência e da irresignação da parte, o juízo de retratação não pode e não deve ser considerado como novo julgamento ou como julgamento inicial na escala recursal.
Como dissemos, ele deve ser visto como arremate de um périplo que havia começado com a interposição do apelo extraordinário contra o acórdão primitivo da Corte Superior trabalhista, passou pela lavra da Corte Constitucional e retornou apenas para esse adendo final.
Poderia ter sido feito o arremate pelo próprio Supremo, mas, por política judiciária, o legislador houve por bem delegar à Corte de origem a tarefa de suplementar a decisão, conformando-a.
Vista a questão por esse prisma de etapa complementar e derradeira da jurisdição constitucional, fica mais claro compreende por que razão não se podem admitir recursos sucessivos contra os acórdãos, sob pena de redução ao infinito da entrega da prestação.
Pode até ocorrer de a parte haver obtido êxito em todas as instâncias e sucumbir pela primeira vez quando não cabe mais recurso, mas, novamente, esse é um risco inerente ao sistema da Repercussão Geral Constitucional e em algum momento o sistema recursal precisa ceder.
Indaga-se, então, quem seria o responsável pelo controle de qualidade desse juízo de retratação, vale dizer, quem controla o acerto e a calibragem do órgão fracionário, para saber se aplicaram corretamente a mentalidade da tese sedimentada em Repercussão Geral Constitucional.
O controle não será feito por Recurso em Sentido Estrito, como sustentamos, mas apenas pela via indireta da Ação Rescisória, se aflorarem vícios na formação do acórdão, ou eventualmente pela Reclamação Constitucional para preservação da autoridade da decisão do Supremo, caso a vontade da decisão tenha sido deturpada.
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Reclamação constitucional com vocação recursal
Os vícios e as virtudes desse sistema de filtragem adicional do Recurso Extraordinário, com o requisito da transcendência constitucional, consubstanciado pelo repertório de repercussão geral, produziu um efeito inesperado da supervalorização do remédio jurídico denominado reclamação constitucional para a preservação da autoridade da decisão.
Embora concebida originalmente para fazer valer a eficácia, em âmbito nacional, das decisões tomadas no controle abstrato de constitucionalidade, sobretudo das decisões de ação direta de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, notou-se que as reclamações constitucionais, aos poucos, ganharam uma feição de recurso inominado e inominável.
De fato, a possibilidade de cassação liminar de sentença, acórdão, decisão de juízo de admissibilidade e demais provimentos jurisdicionais, acusados de descompasso com entendimentos fixados pelo Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado ou difuso, e na ampla gama de temas de repercussão geral, aguça a curiosidade do jurisdicionado e pode representar o salto de algumas instâncias, assoberbando a corte constitucional com a necessidade diária do controle de qualidade das decisões nacionalmente preferidas.
Via de consequência, parece ter surgido, em forma embrionária, uma espécie de jurisprudência das reclamações constitucionais: a leitura das decisões tomadas, de modo monocrático ou colegiado, em sede de reclamação constitucional, permite aclarar alguns conceitos que não estavam tão evidentes nas teses sintetizadas no repertório de repercussão geral.
As reclamações constitucionais, involuntariamente, são reveladoras da exegese do sistema de repercussão geral.
Tome como exemplo eventual dúvida de saber se um verbete podia ou não ser usado por analogia ao outro caso, o que se descobre com a decisão de cassação de uma sentença, que havia se posicionado contra o arrastamento e que sofreu a censura da reclamação constitucional, dentre outras hipóteses.
Admite-se, é bom lembrar, o cabimento da Reclamação Constitucional no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho em desfavor de decisão tomada em Tribunal Regional do Trabalho, mas com os mesmos requisitos de fazer imperar observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade e, também, de acórdão proferido em incidentes de assunção de competência, de resolução de demandas repetitivas e de julgamento de recursos repetitivos.
Incabível a Reclamação Constitucional para garantia de aplicação de simples enunciado verbete sumulado ou jurisprudência representativa não revestida por aqueles instrumentos processuais.
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5. Equilíbrio entre Recurso Extraordinário e Embargos de Divergência
Existe uma peculiaridade de organização judiciária trabalhista que gera incerteza sobre o momento exato da deflagração do Recurso Extraordinário.
Trata-se da possibilidade de um assunto ser encerrado em uma das turmas do Tribunal Superior do Trabalho, em acórdão proferido em recurso de revista, ou de um assunto ser levado para padronização da jurisprudência, por meio do recurso chamado Embargos de Divergência, para a Seção Especializada em Dissídios Individuais.
Embora a Seção Especializada em Dissídios Individuais tenha a primazia para dar a palavra final sobre temas com divergência de interpretação entre as turmas, tecnicamente não existe hierarquia entre os órgãos fracionários, turmários ou seccionais.
Assim, após intenso debate, concluiu-se que o recurso de Embargos de Divergência se insere na categoria dos remédios jurídicos facultativos, não havendo como obrigar a parte a que, antes de acessar o Supremo Tribunal Federal, tente convencer o órgão de origem a padronizar a interpretação, o que talvez poderia ser benéfico se a inclinação fosse favorável ao seu entendimento.
Reforça ainda mais a natureza facultativa dos Embargos de Divergência a percepção de que, talvez, a parte jamais poderia ter acesso a eles, se porventura todas as turmas adotassem o mesmo entendimento, ou seja, teríamos um dilema de determinado entendimento ser inconstitucional e não ser passível de submissão prévia à Seção Especializada em Dissídios Individuais, pela falta do requisito do dissenso jurisprudencial.
Para resolver esse impasse, é fundamental a compreensão da facultatividade dos Embargos de Divergência.
A partir dessa premissa, podemos afirmar que o Recurso Extraordinário pode ser interposto diretamente das turmas do Tribunal Superior do Trabalho ou da Seção Especializada em Dissídios Individuais, com a condição de que, em qualquer caso, o julgamento tenha sido colegiado.
Decisões monocráticas não são passíveis de revisão pelo Supremo Tribunal Federal, porque se considera, de antemão, que não houve o esgotamento da instância de origem, se a parte não buscou provocar o colegiado, por meio do agravo interno, tanto na turma, quanto na Seção Especializada em Dissídios Individuais.
Daí se dizer que, caso ela opte pela alternativa dos Embargos de Divergência, tem que ir até o fim: se sofrer trancamento liminar dos Embargos, por despacho monocrático, é indispensável que submeta o caso ao colegiado, por meio do Agravo Interno, antes de partir para o Recurso Extraordinário.
Em resumo, quando se diz que o Recurso Extraordinário pressupõe o esgotamento da instância de origem, temos que captar a afirmação como esgotamento dos recursos obrigatórios da instância de origem e não dos recursos facultativos.
Do contrário, até mesmo os embargos de declaração teriam que ser interpostos, sucessivamente, para poder alavancar o Recurso Extraordinário. A comparação dos embargos de declaração com os embargos de divergência é pertinente, neste contexto.
Se, todavia, a parte interpuser simultaneamente o Recurso Extraordinário e o recurso de embargos de divergência, contra o mesmo acórdão da Turma do Tribunal Superior do Trabalho, sobre o mesmo tema, incorrerá na violação ao princípio da unirrecorribilidade do ordenamento brasileiro.
O recurso de embargos de divergência será apreciado pela Seção Especializada em Dissídios Individuais e, ao depois, o Recurso Extraordinário, adrede interposto contra decisão da turma, será trancado por duplicidade recursal.
Embora o recurso de Embargos fosse facultativo, a parte não estava autorizada a sacar dois remédios jurídicos simultâneos, contra a mesma decisão.
Ou um, ou outro.
Ela pode, certamente, interpor Recurso Extraordinário contra a decisão superveniente dos Embargos de Divergência na Seção Especializada, mas isso não se confunde com a duplicidade recursal, porque agora o ataque se volta contra o órgão de uniformização de jurisprudência e não contra a decisão original.
A parte deve deixar isso bem claro na sua peça recursal e ter habilidade suficiente para realçar a distinção dos assuntos, porque a simples retomada da discussão dos debates da turma de origem pode representar a inadmissibilidade do Recurso Extraordinário por não ter enfrentado o acórdão dos embargos de divergência.
Como, porém, o Processo do Trabalho é muito rico em cumulações subjetivas de pedidos, é natural que as sentenças ou acórdãos contenham vários capítulos diferentes, independentes e com autonomia dogmática e conceitual, o que gera múltiplas consequências na área trabalhista.
Uma consequência bastante conhecida é a contagem do prazo para Ação Rescisória, em momentos diferentes e tribunais diferentes, dada a possibilidade de capítulos da sentença transitarem julgado separadamente, ao longo dos anos, à medida que cada matéria recorrida se afunila.
Essa perspectiva dinâmica das sentenças permite concluir que o mesmo acórdão de uma Turma do Tribunal Superior do Trabalho pode desafiar, simultaneamente, um Recurso Extraordinário e um recurso de Embargos de Divergência, não sobre o mesmo tema e não violando o princípio da unirrecorribilidade, mas sobre capítulos diferentes.
No plano teórico, a conclusão é inatacável.
No plano prático, a parte precisa ter bastante segurança no passo dado e realçar, nas peças recursais, seu propósito genuíno de desmembrar as matérias, clamando pela manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre um capítulo da sentença e pedindo a padronização decisória, para a seção especializada em dissídios individuais, sobre outro capítulo de sentença, os quais, espera-se, não estejam interligados ou conectados logicamente.
Por deferência e por racionalização do processo, o recurso de embargos de divergência será apreciado por primeiro.
Após o julgamento, os autos voltam para o órgão fracionário, responsável pelo juízo de admissibilidade, para que seja dado andamento ao Recurso Extraordinário que ficou parado nos autos.
Não será impossível, portanto, que haja, no mesmo processo, dois Recursos Extraordinários da mesma parte, caso ela entender necessário atacar, também, o acórdão da Seção Especializada em Dissídios Individuais, por temas distintos daquilo que já constava do extraordinário previamente interposto contra o acórdão turmário.
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Bibliografia consultada
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SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. E-book.
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1SILVA, Homero Batista Mateus da. Direito do Trabalho Aplicado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2021. v. 4. pp. 969-978. O artigo abaixo é uma reprodução quase integral desse trecho do livro do mesmo autor, com adaptações e comentários adicionais feitos especialmente para a página pública da Academia Paulista de Letras Jurídica, em que ocupa a Cadeira 70, Patrono Thomas Marky.