A Petrobras, vencendo as resistências do Planalto impôs, desde o ano passado, a política de preços da gasolina e demais derivados do petróleo baseada na variação de preço do barril de petróleo no exterior, como se todos os combustíveis consumidos no país fossem importados, resultando na gasolina mais cara no planeta, sem paralelo nos países totalmente dependentes do mercado externo. Foi assim que em 2017 houve 116 reajustes no preço da gasolina. Dizem os cínicos burocratas da estatal que é para deixar de subsidiar os combustíveis. Só se a palavra “subsídio” mudou de sentido! A sociedade não pode ser responsabilizada para cobrir os rombos da Petrobras provocados por uma quadrilha organizada. Os consumidores de combustíveis são duplamente responsabilizados por esse rombo: pela primeira vez, de forma indireta, representada pelo pagamento de impostos pagos por toda a sociedade, aonde se inserem os consumidores de combustíveis; pela vez segunda, quando consomem combustíveis onerados com uma estúpida carga de tributos específicos que não obedecem ao princípio constitucional da seletividade de alíquotas em função da essencialidade dos produtos e serviços.
Por isso, Roberto Campos apelidou, acertadamente, aquela estatal de Petrossauro numa alusão ao Dinossauro, um perigoso predador da antiguidade. O mais feroz e o mais temido da família dos Dinossauros era o Tiranossauro Rex que tudo destruía por onde passava.
Essa política traçada pela Petrossauro Rex deu no que era esperado a qualquer momento. Após o reajustamento pela enésima vez dos preços de combustíveis eclodiu a greve dos caminhoneiros que praticamente paralisou em todo o território nacional o abastecimento, não só de combustíveis, como também de gêneros alimentícios e demais produtos e matérias primas utilizados diariamente no parque industrial. São toneladas de alimentos jogados fora, inclusive, leites e carnes, sem contar as semi paralisações de transportes aéreos e coletivos e de indústrias por falta de peças e matérias primas. Causou e vem causando danos irreversíveis na já combalida economia.
Alguns donos de postos de gasolina já aproveitaram a confusão e estão elevando o preço da gasolina restante que varia de R$ 5 reais o litro até R$ 10 reais o litro. E o que estão fazendo os agentes fiscais da área que deveriam estar lacrando esses postos? O mesmo vem acontecendo com a venda de produtos hortifrutigranjeiros. Impressionante como a desonestidade e o mau caratismo que compõem a personalidade oculta da grande parte de maus brasileiros aparentemente alegres, sorridentes e solidários, sempre dando tapinhas nas costas, vêm à tona nos momentos de dificuldades como os de agora, para tirar o máximo de proveito da situação de penúria. É o mesmo comportamento cínico e impudico da Petrossauro Rex que vem tirando proveito da alta do petróleo no mercado internacional, não satisfeita com os fabulosos lucros auferidos na exportação de petróleo bruto extraído de nosso território à custa do dinheiro da sociedade retirado coativamente e investido na mais cara das explorações petrolíferas do mundo. Sim, mais cara do mundo porque o dinheiro consumido para fazer o petróleo jorrar das profundezas do pré sal não condiz com a quantidade extraída, nem com o tempo consumido para fazer jorrar o petróleo. É que parte considerável do dinheiro público ingressou em outras plagas, gerando a praga da crescente corrupção nos setores públicos e no setor privado representado pelas empreiteiras de obras públicas. A Petrossauro Rex é o símbolo da corrupção: “o petróleo é nosso”, como diz o lema que levou à sua fundação na era Vargas, mas os benefícios não, exceto da corrupção desenfreada. O pouco de gasolina que importamos para suprir as deficiências da Refinaria Abreu e Lima que já consumiu U$ 29 bilhões, quando deveria ter sido concluída em 2011 ao custo de U$ 2,4 bilhões conforme valor adjudicado no certame licitatório, na verdade, não significa importação. Trata-se de mera troca internacional. Mandamos petróleo bruto para o exterior e trazemos em troca os combustíveis refinados, enquanto a Abreu e Lima continua construindo, a passos de tartaruga, o que resta para concluir a obra. Pelo jeito nunca irá terminá-la, por razões óbvias!
No fundo, tudo isso é fruto do individualismo arraigado na nossa cultura que vem desde os tempos imemoriais, que alimenta o consumismo sem limites e o “ter” a qualquer custo e de qualquer maneira resultando em uma sociedade separada por um abismo: de um lado alguns poucos aboletados no Poder ou ao redor deles levando vidas de nababos sem ter que suar, trabalhar e produzir, de outro lado, a imensa maioria vivendo abaixo da linha da miséria. A ação individualista e egoística corresponde ao agir sem ética elegendo como norma de conduta o “colher todos os frutos sem plantar a árvore”. Por isso, sempre dissemos, sem ética não há como florescer a Democracia que resulta da prática do dia a dia, e não do que está escrita na Constituição. Por isso, no fundo, todos os problemas são de natureza cultural. Sem a reversão da cultura do egoísmo, do individualismo será muito difícil superar em definitivo as questões mais cruciais de nossa sociedade.
Agora , a Câmara, para tentar remediar a situação caótica em termos de abastecimento, está votando rapidinho um projeto de lei que isenta o diesel do PIS/COFINS, porém, sem apontar as fontes alternativas de compensação da receita, como determina o art. 14 da LRF. É claro que se isso acontecer irá causar um enorme rombo no orçamento sob execução, cerca de R$ 9 bilhões, a exigir a retributação do diesel com alíquota maior que a de hoje, ou a elevação de outros tributos, ou, até mesmo a concretização do fantasma da CPMF que de há muito está rondando nos círculos políticos do Planalto à espera de uma oportunidade.
A Casa Legislativa deveria buscar essa compensação mediante redução drástica das despesas de pessoal no âmbito dos três Poderes, ou com a reversão aos cofres públicos dos fabulosos recursos do inútil fundo eleitoral. Mas, isso nem pensar! Quem tem que pagar o pato é sempre o povo otário, e não eles que elaboram as leis, ainda que em nome desse mesmo povo.
Enfim, remediar a situação presente sem enfrentar a sua causa não irá resolver problema algum. Incentivos fiscais de toda espécie causam rombos nas contas públicas, a serem cobertos com exacerbação da carga tributária a implicar necessidade de exonerações tributárias setoriais que, por sua vez, conduzem ao desequilíbrio do orçamento a exigir nova elevação dos tributos, incorrendo em interminável círculo vicioso. É como o cachorro tentando morder o seu próprio rabo. De tanto ficar girando em seu torno acabará tombando exausto. Só que um cachorro consegue se levantar pouco tempo depois, mas um Gigante quando tomba é diferente.
*Acadêmico titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas.