Perguntei outro dia a uma colega de magistério --- fazendo-o com delicadeza --- se era ela uma seguidora da Religião Marxista. A professora em epígrafe, contrariada, respondeu-me que o Marxismo NÃO É uma religião, e que Marx ficaria indignado com a minha assertiva...não desisti, e perguntei à minha interlocutora se havia lido a obra “Marxismo E Religião”, do meu saudoso mestre Heraldo Barbuy. A resposta à minha pergunta, “não li e não leria”, “en passant” UMA RESPOSTA RELIGIOSA, é o que me decidiu a voltar a este assunto, por mim várias vezes abordado antes.
É ponto pacífico que a vocação nacional dos Gregos foi a Filosofia, e a dos Romanos, a “Jurisprudentia”, entendida como “Ciência do Direito.” Não tenho dúvida em afirmar que a vocação nacional dos Judeus foi --- e é --- a Profético-Religiosa. Com efeito, a Humanidade deve aos Judeus e à sua Religião Nacional, o Judaísmo, a crença na existência de um só Deus (monoteísmo), e a concepção linear do tempo (que caminha do Livro de Gênesis para a frente), substituindo a concepção greco-romana do tempo, cíclica.
Em abono à assertiva de Heraldo Barbuy, no sentido de que o Marxismo é uma Religião, assertiva que aceito “in totum”, há o dado de que Marx era judeu...passou a se chamar “Karl Marx” depois da conversão do seu pai, um próspero advogado, ao Luteranismo. Antes disto, Marx era “Kissel Mordecai.” Mais ainda: o jovem Marx era oriundo de uma ilustre família de Rabinos. E isto deve ser levado em conta, como é óbvio, na apreciação da sua vastíssima obra.
Como com argúcia observava o Professor Heraldo Barbuy, o Marxismo é uma heresia cristã, na qual Jesus Cristo, o filho unigênito de Deus e redentor da Humanidade é substituído pelo Proletariado, a classe redentora da Humanidade!... aqui está o ponto nevrálgico da questão: O Cristianismo promete a salvação dos homens no plano espiritual, na Eternidade própria de Deus, ele mesmo eterno. E o Marxismo promete a salvação dos homens NESTA VIDA, NESTE MUNDO, NO PLANO TERRENO, DA MATÉRIA.
A palavra “Religião” vem do Latim “Religio, onis”, um vocábulo feminino da terceira declinação, em que está ínsita a ideia de “re-ligação.” A Religião “religa” o Homem à Divindade. E não por acaso o “Pontífice”, em Latim “Pontifex, icis”, é aquele que faz a ponte entre o Homem e Deus. Não é ocioso lembrar aqui o título de “Sumo Pontífice”, ostentado pelo Papa, o Vigário de Cristo na Terra...
Do que foi dito é possível inferir que toda Religião transcende a matéria, e se encaminha para o espiritual. A Religião marxista é pois, sob este aspecto, “sui generis”: --- Parte da matéria, tem como alicerce e ponto de apoio o dogma (e é realmente um “dogma”...) do primado do econômico sobre todos os outros fatores, e visa a matéria, vale dizer, a sociedade do futuro, comunista, sem classes sociais, sem o Estado e sem fronteiras nacionais. Segue-se que, ao afirmar a imanência do Homem na matéria, e ao lhe negar a transcendentalidade, Marx insultou o próprio Judaísmo, a Religião dos seus maiores. E, ao mesmo tempo, criou uma heresia cristã.
Além da já apontada “retro”, há outras semelhanças entre o Cristianismo e a sua herética contrafação, que é o Marxismo: --- Ao tempo da defunta União Soviética, nas concentrações comemorativas dos dias cívicos, na Praça Vermelha de Moscou, eram exibidos retratos de Marx, Engels e Lenin, que imitavam os ícones da Igreja Ortodoxa Russa.
Como é sabido, os corpos de alguns santos cristãos conservaram-se incorruptos após a morte. Os bolchevistas não deixaram por menos: Mumificaram o cadáver de Lenin, ainda hoje exposto, e destino de inúmeras “romarias ideológicas”!...
Outras comparações corroboram a assertiva inicial, de que o Marxismo é uma Religião, ateia e materialista. A Igreja Católica, Apostólica e Romana manteve em sua estrutura, por muito tempo, o Tribunal do Santo Ofício, ou da Santa Inquisição, responsável pela ortodoxia da doutrina católica. Este Tribunal hoje é chamado de Sagrada Congregação Para A Defesa Da Fé. Ora, as sempre arqui-temidas “Polícias Políticas” dos regimes comunistas, encarregadas de zelar pela pureza doutrinária das doutrinas e do pensamento do Profeta Marx, jamais passaram de uma esdrúxula “Inquisição Comunista”...
Procuro terminar de maneira leve a abordagem deste tema, em si mesmo árido, pesado. Meu amigo Fred Blasi --- um impenitente leitor de Machado de Assis --- costuma dizer, com uma fina ironia machadiana, que Jesus Cristo foi mais realista do que Marx: --- Prometeu aos homens o Paraíso após a morte, e Marx o prometeu para a vida terrena!...
*Acacio Vaz de Lima Filho é advogado e professor universitário, é acadêmico perpétuo da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Dedica este artigo ao seu antigo instrutor no Curso de Cavalaria do C.P.O.R. – S.P., Coronel de Cavalaria Carlos Antonio Espírito Hofmeister Poli