Ruy Altenfelder - Advogado e presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas / Cláudia Buzzette Calais - Diretora executiva da Fundação Bunge
O desemprego, que atinge expressiva massa de trabalhadores brasileiros, tem sido uma realidade distante do mercado dos profissionais de tecnologia da informação (TI). A demanda por esses trabalhadores supera em muito a oferta. Serão necessários 420 mil técnicos nessa área nos próximos dois anos, mas nossas escolas só conseguem formar 46 mil por ano, segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom).
Embora muitas empresas invistam em cursos de formação gratuitos para suprir a própria demanda, o esforço tem sido insuficiente. É urgente, portanto, uma ação mais efetiva de governos para melhorar a qualidade da educação e tornar o Brasil autossuficiente em tecnologias modernas. O apoio ao ensino técnico como política pública precisa estar no centro dessa ação.
A pandemia acelerou a digitalização de processos em todas as áreas e fez aumentar a procura por profissionais em tecnologia no e-commerce, serviços financeiros, automação de processos variados, inteligência artificial na saúde e na agroindústria. Ao mesmo tempo, o isolamento social causou impacto negativo na rotina de nossas escolas, com redução na procura pelos cursos profissionalizantes. O país, que nas últimas duas décadas experimentou um boom de cursos universitários, continua carente de cursos técnicos.
O Censo Escolar do Inep mostra que as matrículas nos cursos profissionalizantes públicos e privados recuaram em 2021 ao patamar de 2018, depois de quatro anos de crescimento contínuo. Tinham sido 1,83 milhão em 2017, subiram para 1,93 milhão em 2020 e recuaram para 1,89 milhão em 2021. Entretanto, as matrículas no ensino profissionalizante já tinham sido muito maiores seis anos antes da pandemia: 1,94 milhão em 2014. Ou seja, a menos de dois anos do fim do ciclo, estamos longe de cumprir a meta do Plano Nacional de Educação 2014-2024, que previa a necessidade de triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio no período. Apenas 8% dos estudantes estão nessa modalidade de ensino, contra 40% nos países da OCDE e 46% na União Europeia, conforme dados divulgados em audiência pública, na Câmara dos Deputados, por representante do Ministério da Educação, em 2021.
A educação tradicional não dá conta de potencializar o que os estudantes estão dispostos a fazer para terem alguma profissão antes de concluírem um curso superior. Estamos diante de uma geração de jovens cada vez mais nativos digitais, que dominam desde cedo ferramentas inimagináveis há 20 anos e que podem ser usadas em inúmeras atividades. Corremos o risco de perder uma incrível oportunidade de dar a eles os meios necessários para que aproveitem sua vocação, habilidades inatas, intuição e energia naquilo que lhes for mais produtivo e compensador.
Para contornar o problema, algumas empresas passaram a fazer menos exigências aos candidatos a emprego. Notaram que, ao exigir fluência em língua estrangeira ou certificados de formação acadêmica, podem estar dispensando pessoas criativas, capazes de aprender rapidamente no ambiente de trabalho e de serem futuros líderes em suas áreas. Para muitas das atividades em tecnologia, não é mais preciso aguardar que os candidatos completem o ensino superior, ainda inacessível para a maioria.
Por isso, é o momento de facilitar e incentivar o acesso do jovem a cursos técnicos e a atividades que aproveitem e desenvolvam suas habilidades e inteligências. Há enormes necessidades e oportunidades em tecnologia da informação e comunicação, análise de dados, programação, automação, gestão de processos e webdesign no comércio, serviços, comunicações, transportes, indústria e no agro.
É preciso que o resultado desse esforço torne as novas tecnologias acessíveis e disponíveis a todos, principalmente aos jovens, sejam eles residentes do campo ou das cidades. Só assim poderemos avançar em processos produtivos cada vez mais eficientes, inclusivos e sustentáveis.