Fonte: Jornal SP Norte - 19/01/2020
Tem causado debates, a restrição da liberdade em relação à recente Lei 13.967 de 26/12/2019. Coloca-se, como pontos a serem discutidos, a constitucionalidade, a legitimidade de governadores dos Estados-membros para propor uma ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade, a competência legislativa dos Estados-membros, o momento, se constitucional, para aplicação da norma diante de sua validade, vigência e eficácia e a necessidade de alteração ou criação de um novo Regulamento, agora Código de Ética e Disciplina, no prazo de 12 (doze meses).
CONSTITUCIONALIDADE. O controle de constitucionalidade “é, pois, a verificação da adequação de um ato jurídico (particularmente da lei) à Constituição. Envolve a verificação tanto dos requisitos formais – subjetivos, como a competência do órgão que o editou; - objetivos, como a forma, os prazos, o rito, observados em sua edição – quanto dos requisitos substanciais – respeito aos direitos e às garantias consagrados na Constituição – de constitucionalidade do ato jurídico.1
Uma lei é inconstitucional quando contraria no todo ou em parte a Constituição. “O princípio de constitucionalidade exige a conformidade de todas as normas e atos inferiores, leis, decretos, regulamentos, atos administrativos e atos judiciais, às disposições substanciais ou formais da Constituição”.2
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, no Título II, Capítulo I, que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, artigo 5º, inciso LXI, estabelece:
“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”
Poder-se-ia dizer, já, tratar-se de matéria constitucional incontrastável por lei ordinária a qual será nula ao contrariar a Lei Maior. Todavia, neste caso, sequer por Emenda poderá ser alterada a Constituição Federal, vez que impedida por ser cláusula pétrea, conforme o Texto do artigo 60, § 4º, inciso IV:
§ 4º “Não será objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir:
...
IV – os direitos e garantias individuais”
Como vimos, o Texto Magno, traz a matéria no capítulo dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos. Neste dispositivo, ressalva, excepciona as transgressões militares e os crimes propriamente militares, facultando a prisão ou restrição da liberdade em cláusula inatingível por Emenda e por maior razão por lei. Enfatiza-se que entre a regra geral e a exceção ou regra específica, prevalecerão estas duas últimas.
Ainda mais, para uma interpretação sistemática, do hermeneuta, temos o artigo 142, § 2º, da Lei Magna que diz:
“Não caberá ‘habeas corpus’ em relação a punições disciplinares militares”
Verificamos que permite a prisão e nem cabe “habeas corpus”. Portanto, hipoteticamente, se coubesse alterações, desconsiderando a rigidez máxima, argumentando não tratar-se de abolir direitos, estas modificações deveriam operar-se por Emendas e não por lei.
A Lei 13.967 de 26/12/2019, que altera o artigo 18, do Decreto-Lei 667 de 2/7/69 expressa:
“As polícias militares e os corpos de bombeiros militares serão regidos por Código de Ética e Disciplina, aprovado por lei estadual ou federal para o Distrito Federal, específica, que tem por finalidade definir, especificar e classificar as transgressões disciplinares e estabelecer normas relativas a sanções disciplinares, conceitos, recursos, recompensas, bem como regulamentar o processo administrativo disciplinar e o funcionamento do Conselho de Ética e Disciplina Militares, observadas, dentre outros, os seguintes princípios:
...
VI – vedação de medida privativa e restritiva de liberdade”
Depreende-se, com clareza, o choque entre as normas e deve prevalecer, hierarquicamente, a Constituição Federal, declarando-se inconstitucional a lei que compromete, inclusive, a hierarquia e a disciplina na função especializada dos militares e corpos de bombeiros.
Há uma inconstitucionalidade no requisito substancial ao vedar medida privativa e restritiva de liberdade, permitida pela Lei Maior.
Daremos continuidade na próxima edição.