acacio vaz de lima filho 60No artigo em que relatei as vergonhosas perseguições sofridas em São João da Boa Vista pelas colônias alemã e italiana, ao tempo da II Guerra Mundial, tive a oportunidade de afirmar que também a Guerra está sujeita a limites impostos pelo Direito. A comprovar esta assertiva, está o dado de que o jurista holandês Hugo Grotius, considerado o “Pai do Direito Internacional” deu, ao seu clássico livro o título de “De Jure Belli Ac Pacis”, ou seja, “A respeito do Direito da Guerra e da Paz”...

Na II Guerra Mundial, a Alemanha quedou vencida em Maio de 1945, quando a Chancelaria do Reich, em Berlim, foi tomada pelas tropas comunistas da União Soviética. Pouca gente sabe deste detalhe, mas ele é no mínimo interessante: --- Os derradeiros defensores de Berlim não eram alemães, porém franceses, e integrantes da SS. Panzerdivision Charlemagne!...

Se na Europa a luta armada terminara, ela continuava na Ásia, até o início do mês de Agosto de 1945, uma vez que o Império do Japão resistia ao ataque conjunto dos Estados Unidos da América e da União Soviética. O Japão estava em luta com os Estados Unidos, desde 7 de Dezembro de 1941, data do ataque nipônico à base norte-americana de Pearl Harbor, no Oceano Pacífico.

A operação japonesa de Pearl Harbou fora planejada pelo homem que, seguramente, foi o maior estrategista da guerra naval e aeronaval da II Guerra. Eu me refiro ao Almirante de Esquadra Isoroku Yamamoto, que recebera ordens do seu governo para planejar o ataque. Grifei em itálico, pois o Almirante Yamamoto --- um homem que estudara, inclusive, em Universidades Americanas, e conhecia o potencial da indústria dos Estados Unidos --- tinha plena consciência de que o Japão não poderia vencer os Estados Unidos... mas era um militar, e “tollitur quaestio”: --- Obedeceu e preparou o ataque, que se realizou.

É possível afirmar hoje, com absoluta segurança, que a politica de pressão econômica de Roosevelt contra o Império Japonês, praticamente levou o Japão à guerra, que lhe foi desastrosa. As previsões de Yamamoto se realizaram, e as forças japonesas foram levadas de vencida. Resistiam ainda, sem embargo, no início de Agosto de 1945, quando o Presidente dos Estados Unidos era Harry Salomon Truman, que substituíra Roosevelt.

Na quadra ora delineada, é que foi perpetrado aquele que, sem sombra de dúvida, foi o maior crime de guerra da segunda conflagração mundial, e um dos maiores crimes de guerra de todos os tempos: --- O bombardeio atômico das cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, respectivamente nos dias 6 e 9 de Agosto de 1945. Com efeito, no dia 6 o avião B-29 “Enola Gay”, sob o comando de Paul Warfield Tibbets Jr., lançou uma bomba atômica sobre a cidade de Hiroshima. E no dia 9 de Agosto, a aeronave B-29 “Bockscar”, comandada por Charles Sweeney, atirou uma segunda bomba atômica sobre a cidade de Nagasaki. Os engenhos atômicos matavam pelo deslocamento de ar e, sobretudo, pela enorme elevação da temperatura do local das explosões. Pessoas --- homens, mulheres, velhos e crianças --- literalmente morreram queimadas. E, como é de compreensão intuitiva, os efeitos da radiação atômica se fizeram sentir por muitos anos nas regiões afetadas.

O pretexto dado pelo governo democrático do Sr. Harry Salomon Truman para o lançamento das bombas atômicas, foi o de que era necessário apressar a rendição do Japão. O lançamento das duas bombas “pouparia vidas tanto de japoneses quanto de americanos”, pois um desembarque com a resistência japonesa seria evitado... o argumento é mendaz, e chega a ser sórdido: --- O Império Japonês estava no fim dos seus recursos, e a resistência a um desembarque americano, ainda que desesperada, seria ínfima. E continua de pé o fato atroz: --- Hiroshima e Nagasaki eram alvos civis. Nas duas cidades não havia qualquer indústria bélica, nem depósitos de munições, nem cousa alguma de interesse militar!...

À luz do Direito das Gentes, do velho “Jus Gentium”, em suma, do Direito Internacional, foi um crime de guerra o morticínio dos civis japoneses de Hiroshima e Nagasaki. Um detalhe que talvez não seja despiciendo: --- Em ambas as cidades, concentravam-se os católicos do Japão, devendo ser lembrado que a evangelização do arquipélago tinha sido iniciada pelos jesuítas portugueses chefiados por São Francisco Xavier... Será que o Sr. Harry Salomon Truman, então Presidente dos Estados Unidos da América, tinha um ódio particular aos católicos?... em caso afirmativo, porque?... fica a pergunta.


* Acacio Vaz de Lima Filho, Livre-Docente em Direito Civil, área de História do Direito, pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, é acadêmico perpétuo da Academia Paulista de Letras Jurídicas, e autor de livros e artigos de História do Direito.