(Correio Braziliense)
Em carta endereçada ao amigo Gaudêncio Torquato, em linguagem coloquial, comentei que as atitudes mais duras do procurador-geral da República - que tive oportunidade de elogiar em diversos artigos -, parecem destinar-se a proteger a presidente Dilma. Os principais responsáveis pelo maior assalto às contas públicas brasileiras, cujos nomes foram citados em delações premiadas, não sofreram até agora pedido tão grave quanto aquele formulado contra um ex-presidente da República e do Congresso Nacional, contra o atual presidente do Congresso, contra o presidente do PMDB e contra o presidente afastado da Câmara. E, tudo isto, em momento delicado da vida nacional.
Admitindo que o Pretório Excelso aceite tal ingerência em outro Poder, caberá ao Senado Federal e à Câmara, por maioria absoluta, deliberar a respeito, criando crise institucional sem precedentes. Se não decidir a favor da prisão, poderá gerar a sensação de que o STF estaria sendo omisso - apesar de não o ser, pois cabe-lhe a função maior de manter a estabilidade das instituições, só superável em caso de confronto entre os Poderes, pelas Forças Armadas, por força do artigo 142 da CF.
Não obstante a admiração que nutro pelos ministros do STF - com alguns dos quais tenho livros escritos, sou confrade em academias científicas ou tive a honra de contar com artigos de sua autoria em livros em minha homenagem aos 70 e 80 anos -, critiquei a violação do artigo 53 § 3º da CF, pois, na aceitação de cautelar em processo investigatório para denúncia contra atos praticados no exercício do mandato (no caso, obstrução do andamento do processo, na Comissão de Ética), caberia ao STF apenas comunicar à Câmara. Se esta não sustar o andamento da ação, suspende-se o curso da prescrição criminal, enquanto durar o mandato (art. 53, § 5º).
O procurador-geral, todavia, entrou com o pedido de afastamento do presidente da Câmara, antes do processo de admissibilidade do impeachment, só julgado pela Suprema Corte, depois de cumprida essa fase. E o precedente perigoso acabou gerando o novo pedido, agora mais grave, e propiciador de profunda instabilidade nas relações políticas entre os Poderes.
O curioso é que nenhum pedido dessa gravidade foi apresentado até agora pela Procuradoria-Geral, relativamente à presidente da República e seus ministros afastados, apesar de essas pessoas serem reiteradamente referidas em delações coincidentes e dos bilhões de reais desviados das burras governamentais pelos membros de seu governo. Lembre-se que as Procuradorias Regionais da República, como no Paraná, têm autonomia funcional, para agir, sem interferência direta do procurador-geral.
Não estou aqui a defender nenhum dos quatro denunciados, cujas gravações exibidas provocaram sérias perplexidades na população. O pedido de prisão preventiva de imediato, todavia, parece desproporcional, gerando a impressão de que não poderia ter vindo em pior momento. Enquanto isto, nenhum pedido com esse rigor foi protocolado contra aqueles que protagonizaram ou permitiram a maior história de corrupção da história do mundo, durante anos e anos, prejudicando o povo brasileiro. Por que esta seletividade?